Colunista Ana Luísa Guimarães: Compasso de espera para o aviso relativo às agregações em baixa
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Colunista Ana Luísa Guimarães: Compasso de espera para o aviso relativo às agregações em baixa

Tal como foi noticiado, o Governo acredita que os ganhos de escala supramunicipal que resultarão das agregações dos sistemas municipais de água contribuirão para mitigar as quatro grandes patologias de que, de acordo com o balanço realizado sobre os 6 meses de PENSAAR, o setor padece.

Enquanto não sai o tão aguardado aviso do PO SEUR relativo à atribuição de fundos para a apoiar a criação de sistemas municipais agregados (isto é, de sistemas intermunicipais), sabe-se já, entretanto, que nesse contexto serão valorizadas as candidaturas que contem com uma entidade gestora de referência que funcione como âncora dos demais sistemas municipais agregados. Há, assim, um apelo às entidades cujo modelo tenha já provas dadas em termos de funcionamento eficiente para que se disponibilizem a partilhar e a disseminar a sua experiência no seio de um sistema maior, que reúna entidades mais pequenas e menos desenvolvidas.

Sem prejuízo do número de que se fala de grupos já bem encaminhados naquele sentido e que estarão já a preparar o terreno para uma candidatura ao tal aviso, antecipo, no entanto, que a sedução e o envolvimento dessas “entidades âncora” para processos deste tipo possa não ser tão simples quanto à primeira vista possa pensar-se. Para além da complexidade naturalmente associada à modulação de um processo de agregação para que fique bem construído e ofereça garantias de estabilidade futura – que já anteriormente aqui assinalei -, parece-me que entidades que hoje já funcionam bem (ou, pelo menos, bem melhor do que a generalidade das demais) necessitarão de incentivos fortes que as levem a misturar-se com outras menos eficientes e a arriscar a manutenção futura da performance já alcançada. 

A propósito, e no quadro do compasso de espera pela publicação do mencionado aviso do PO SEUR, vale a pena atentar-se no artigo 66.º da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, que aprova o Orçamento de Estado para 2017. Ali se estabelece, no seu n.º 1, que “os municípios que assegurem níveis de eficiência nos respetivos sistemas municipais ou intermunicipais, em termos a definir no decreto-lei de execução orçamental, são dispensados da obrigação de adoção de taxas ou tarifas relacionadas com os serviços municipais de abastecimento de água, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos, por decorrência de mecanismos de recuperação financeira municipal previstos no artigo 35.º da Lei n.º 53/2014, e no artigo 59.º da Lei n.º 73/2013, de 3 de setembro (…)”.

Sem prejuízo da perplexidade e das dificuldades de interpretação que, pelo menos à primeira vista, suscita – destacando-se a dispensa de certos municípios da obrigação de adoção de taxas ou tarifas relacionadas com os serviços municipais de água, saneamento e resíduos -, parece que tal dispensa só se aplica a municípios com certo nível de eficiência na gestão dos serviços. Ora, se é certo que o nível de eficiência relevante para este efeito só será conhecido com a publicação do decreto-lei de execução orçamental, a verdade é que esta disposição legal pode funcionar como desincentivo para o envolvimento dos tais municípios âncora eficientes à pretendida agregação.

 

Provocação do mês: A sedução de “entidades âncora” para processos de agregação de sistemas municipais em baixa pode não ser tão simples quanto à primeira vista possa pensar-se, devendo criar-se incentivos para que tais entidades vejam essa agregação com bons olhos.

Ana Luísa Guimarães é advogada na Sérvulo desde 2008, na área de Público, exercendo a sua atividade com especial incidência em matéria de contratação pública e no domínio da regulação das utilities, como águas e resíduos. É Mestre em Direito Público, pela Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa. Leciona frequentemente, desde 2012, em cursos de pós-graduação realizados na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, no âmbito de diversos temas na área de contratação pública e do direito da água e dos resíduos e é cocoordenadora científica dos cursos de pós-graduação em Direito da Água e em Direito dos Resíduos, organizados pelo Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. 

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