
Colunista Nuno Campilho (Água e Resíduos - Regulação): Proverbial
Numa altura em que se discutem, definem e aprovam as tarifas a praticar, em 2018, no âmbito dos serviços de abastecimento de água para consumo humano, saneamento de águas residuais e recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos, a administradora da ERSAR, Ana Albuquerque, vem dizer, ao Água&Ambiente na Hora, que as câmaras municipais, que asseguram a gestão direta dos sistemas de água e saneamento, vão ter a possibilidade de estabelecer o nível de subsidiação às tarifas. Confesso que não consigo perceber bem o que é que isto quer dizer e para o que é que isto serve, mas só pode ser desconhecimento, incompetência, ou o privilégio de gerir uma das maiores (e melhores) entidades gestoras do país.
Acrescenta, ainda, a Dr.ª Ana Albuquerque, que serão as autarquias que acabarão por definir as tarifas. Extraordinário! Mal seria se assim não fosse, pois, a autonomia do Poder Local ainda deve valer de alguma coisa.
Permitam-me, no entanto, ir mais longe, pois o que parece estar em causa é a acessibilidade económica, mas isso já deveria estar assegurado (pois é esse o principio) pela aplicação da tarifa familiar e da tarifa social, esta última, recentemente, tornada obrigatória e automática, por decisão da Assembleia da República (mais um caso, extraordinário e inevitável, de antecipado incumprimento, pois esse automatismo só pode ser assegurado através do cruzamento de dados entre as entidades gestoras, a autoridade tributária e a segurança social, portanto, já todos estamos a ver qual é o destino desta Lei – o que vale é que não se poderá queixar de solidão –).
Mais uma vez, equivoco atrás de equivoco (ou como diz o provérbio, cada tiro, cada melro), vem uma notícia do DN, de 20 de novembro, relatar que, ao contrário do que já acontece em 173 municípios do país, em Oeiras, não há tarifa especial para famílias numerosas, acrescentando-se que é um dos concelhos onde a água é mais cara (errado, nos SIMAS de Oeiras e Amadora, os valores das tarifas são inferiores às médias simples e mediana do conjunto das entidades gestoras que fazem parte da AMEGA). Como se não bastasse uma mentira, é melhor virem aos pares. Deve ser como à meia dúzia...
Não satisfeitos com uma jornalista mal (in)formada, só mesmo a presidente da Associação Portuguesa de Famílias Numerosas (APFN) vir confirmá-lo, por exclusão de partes, digo eu, pois ao afirmar que existem 173 tarifários familiares e que, nos restantes, as famílias numerosas continuam a ser penalizadas... como eu sou bom entendedor... (o que não significa que seja inteligente, pois fui, ingenuamente, a convite da mesma APFN, assistir à apresentação da segunda edição do estudo comparativo dos tarifários de água, no dia 18 de outubro, na Fundação Millenniumbcp. Para quê??).
Sob pena de me estar a desviar, em demasia, do assunto, permitam-me regressar às declarações da administradora da ERSAR, quando diz que, “em alguns casos as tarifas são tão baixas que, para incorporar custos, os preços praticados poderiam subir demasiado (...) no entanto (...) quando a tarifa garantir proveitos que cobrem os custos (...) não deve haver lugar à subsidiação”. Ora bem, como é que hei-de por isto sem correr o risco de estar a ofender alguém... já sei... vou formular uma pergunta (e esperar sentado): quando as entidades em alta cobram, respetivamente para a água e para o saneamento, mais 4% e mais 5% que no ano transato, estamos a subsidiar quem?
Ana Albuquerque lembra, ainda, que “existe um conjunto alargado de entidades gestoras (...) que não têm as tarifas a cobrir custos” e acrescento eu, que existe um conjunto reduzido de entidades gestoras que têm as tarifas a cobrir os seus custos, os custos das entidades em alta, os custos das famílias, os custos da acessibilidade económica, os custos da sustentabilidade económica e, pasmem-se, ainda são apontadas como tendo uma regime tarifário acima do que seria expectável (não adianta tentarem explicar-me, burro velho... – mais o primeiro do que o segundo –).
E, porque importa ter memória, faz-me lembrar quando eu andava tão satisfeito (e tranquilo) com a ERSAR, porque sempre se manifestou contra a prática de preços políticos na água, quando, em 2012, alguém se lembrou de fazer uma proposta de Lei que determinava que os membros do conselho de administração dos serviços municipalizados passavam a ser nomeados pela câmara municipal, de entre os seus membros (n.ª 2, do art.º 12.º, daquilo que, de proposta, passou a ser, efetivamente, a Lei n.º 50/2012, de 31 de agosto). E será que a ERSAR disse alguma coisa? Deve ter dito, pois faz parte dos seus estatutos ser consultada em matérias da sua competência regulatória. E o que é que disse? Isso já não sei, só sei que até um tolo pode passar por sábio e inteligente se ficar calado, coisa que, infelizmente (como dá para perceber), eu não consigo.
Nuno Campilho é licenciado em Relações Internacionais pela Universidade Lusíada e Pós-graduado em Comunicação e Marketing Político e em Ciência Política e Relações Internacionais. Possui ainda o Executive MBA do IESE/AESE. Foi presidente da União das Freguesias de Oeiras e São Julião da Barra, Paço de Arcos e Caxias e consultor especializado em modelos de gestão de serviços públicos de água e saneamento. Foi administrador dos SMAS de Oeiras e Amadora e chefe de gabinete do Ministro do Ambiente Isaltino Morais. Exerceu ainda funções de vogal do Conselho de Gerência da Habitágua, E.M.. É membro da Comissão Especializada de Inovação da APDA e Diretor Delegado dos SIMAS de Oeiras e Amadora.