Colunista Paulo Praça (Resíduos-Tendências): Por uma Nova Cultura Ambiental
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Colunista Paulo Praça (Resíduos-Tendências): Por uma Nova Cultura Ambiental

Terminada a “seally season”, setembro marca a reentré da ordem de trabalhos e um dos temas que de muito se fala continua – e continuará – prende-se com as consequências das alterações climáticas sobre as quais, com mais ou menos peso, todos temos responsabilidades, uns mais do que outros é certo, sendo certo também, infelizmente, que a cada ano que passa é feita uma estimativa sobre o dia em que é atingido o limite do uso sustentável de recursos naturais disponíveis no Planeta para esse ano, tendo sido anunciado que este ano esse limite foi atingido no dia 2 de agosto, o chamado “Overshoot Day”. O que significa que a partir do dia 2 de agosto já estamos a utilizar os recursos existentes para o ano seguinte.

Neste sentido, a transição para a Economia Circular deverá assumir um papel fundamental no desenvolvimento de projetos que permitam a maximização da utilização das matérias-primas, produtos e resíduos, com vista a promover o crescimento económico de forma sustentável, proporcionando novos modelos de negócio e a criação de mais emprego.

É sobre este novo modelo que estão a ser retomadas as conversações ao nível das instâncias comunitárias na sequência das propostas de alterações legislativas, em curso, no âmbito do Plano de Ação da EU para a Economia Circular, lançado pela Comissão Europeia, no final de 2015, cuja discussão desde então continua a decorrer.

Foi assumido pela própria Comissão Europeia no âmbito das medidas apresentadas que a gestão de resíduos assume um papel central na economia circular, uma vez que a “hierarquia de resíduos determina uma ordem de prioridade, desde a prevenção, passando pela preparação para a reutilização, a reciclagem e a recuperação de energia, até à sua eliminação”.

Neste sentido foram apresentadas ambiciosas metas, como por exemplo atingir uma percentagem de reciclagem de 65% dos resíduos urbanos e 75% dos resíduos de embalagens, reduzir a deposição em aterro a um máximo de 10% de todos os resíduos, a atingir até 2030, estando atualmente em discussão também o alargamento deste período por mais dez anos. Para alcançar estas metas - que para uma grande parte dos países não é de todo realista - também estão previstas medidas de apoio financeiro.

Independentemente das metas que vierem a ser fixadas e dos instrumentos financeiros que vierem a ser disponibilizados, será imprescindível uma mudança radical de hábitos por parte de todos os atores da sociedade: instituições; empresas; sistemas de tratamento de resíduos e cidadãos. Não posso deixar de sublinhar o papel que os cidadãos terão nesta matéria, uma vez que o modelo subjacente à economia circular encerra em si mesmo uma questão de cidadania.

E nesta área ainda há muito trabalho a fazer, por isso não podemos deixar de saudar as iniciativas que têm sido recentemente anunciadas no que respeita ao lançamento de apoios financeiros no âmbito do Fundo Ambiental, em particular sobre a necessidade da promoção de uma lógica de proximidade com as populações, sendo reconhecido que para promover a economia circular no que respeita à alteração dos hábitos de consumo e de interiorização deste “novo” conceito, há um longo caminho a percorrer.

No âmbito da referida transição do modelo de economia linear para o modelo de economia circular foi assumido pela Comissão Europeia um papel fundamental ao nível da gestão de resíduos, e fixadas ambiciosas metas que implicarão um esforço adicional a todos os que têm responsabilidades nesta área, mas de forma incisiva aos sistemas de gestão de resíduos urbanos, já que a discussão tem sido centrada ao nível dos resíduos urbanos, com poucas responsabilidades para a indústria em geral.

Com efeito, pelas tarefas que lhe estão legalmente atribuídas, os Sistemas de Gestão de Resíduos Urbanos (SGRU) terão de assumir, necessariamente, um papel relevante nesta matéria. Não só pelo exercício das atividades próprias da gestão e tratamento de resíduos, mas também pelo conhecimento que têm dos hábitos de consumo e do destino que é dado pelos cidadãos aos resíduos que produzem. Com efeito, das caracterizações sistemáticas das cargas de resíduos encaminhadas pelos SGRU é possível fazer um retrato da sociedade, como foi muito visível nos anos mais críticos da crise vivida em Portugal, como também da própria maturidade em termos da correta separação de resíduos, sendo notória a necessidade de aprofundamento na área da sensibilização para o encaminhamento correto dos resíduos para que Portugal possa alcançar as metas em discussão e contribuir de forma global para um modelo de desenvolvimento sustentável.

Pelo que não pudemos deixar de estranhar e também de lamentar, que numa iniciativa que consideramos de especial utilidade, como foi o lançamento do Aviso “Apoiar um Nova Cultura Ambiental” no âmbito do Fundo Ambiental, que se propunha precisamente a reforçar investimentos conducentes a uma alteração de comportamentos efetiva e orientada para a prossecução dos três pilares da política ambiental: a descarbonização da sociedade, a transição para a economia circular e a valorização do território, que o setor empresarial local com responsabilidades e conhecimento privilegiado sobre o assunto tenha ficado de fora da possibilidade apresentar projetos que julgamos muito poderiam contribuir para promoção de uma cidadania ativa no domínio do desenvolvimento sustentável e para a construção de uma sociedade de baixo carbono, racional e eficiente na utilização dos seus recursos.

Paulo Praça é licenciado em Direito com pós-graduações em Direito Industrial, Direito da Interioridade e Direito das Autarquias Locais. Possui o título de Especialista em Solicitadoria. É Diretor-Geral da Resíduos do Nordeste e Presidente da Direção da ESGRA – Associação de Empresas Gestoras de Sistemas de Resíduos. É docente convidado na Escola Superior de Comunicação, Administração e Turismo do Instituto Politécnico de Bragança, no Mestrado de Administração Autárquica e na Licenciatura de Solicitadora, nas matérias de Ordenamento, Urbanismo e Ambiente, e ocupa ainda o cargo de investigador do Núcleo de Estudos de Direito das Autarquias Locais (NEDAL), subunidade orgânica da Escola de Direito da Universidade do Minho (EDUM). Foi Adjunto da Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Economia, no XV Governo Constitucional, Assessor do(s) Ministro(s) da Economia e do Ministro das Finanças e da Economia, no XIV Governo Constitucional, e Assessor do Ministro da Economia, no XIII Governo Constitucional. Nos últimos anos tem participado em diversas ações de formação como orador e participante. É também autor de trabalhos publicados.

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