
Nuno Campilho: Poderes fátuos... saberes difusos
Pelas minhas contas, deverão existir, em Portugal, perto de 100 mil profissionais dedicados ao setor da Água e do Saneamento, desde entidades gestoras, câmaras municipais, entidades da tutela, regulador, associações, etc. Incluo todas as categorias profissionais e não profissionais, desde operacionais a técnicos, passando por dirigentes e administradores e até governantes.
As perguntas, eventualmente, sem resposta, são: Qual a formação destas pessoas? Terão, estas pessoas, que contribuem, diariamente, para a prestação de um dos serviços mais essenciais da sociedade, a formação adequada?
Numa altura em que se renovaram equipas de gestão um pouco por todo o país, não consigo encontrar evidências de formação profissional adequada, em alguns casos, para o desempenho das funções em referência. E, atenção, não estou a falar de questões de forma. Falo de questões de conteúdo. Trabalhar no setor da Água e do Saneamento requer knowledge & skills que, desculpem-me os mais incautos, não estão ao alcance de todos.
Então, certamente, o setor, no seu espírito coletivo, hermético e impenetrável que tão bem o caracteriza, criou e cria as condições para que essas habilitações sejam apreendidas, com base num programa interno de formação, estruturado em função das tarefas e das responsabilidades dos seus profissionais, associado às categorias, aos cargos e às responsabilidades que lhes estão incumbidas. Hum... pois... E o talento, puf!
Valha-nos algumas entidades e associações que, através dos seus encontros, jornadas técnicas e formação académica, têm vindo a dar um contributo inestimável e que, na maior parte das vezes, pior do que ser inglório, não é, minimamente, reconhecido. Falo da APDA, da APRH, da APESB, da APEA, da EPAL e até do LNEC, numa perspetiva, mais, de I&D, e, mais recentemente, do LIS Water, com o ProAguas. Bem hajam!
"Enquanto o regulador continuar, tão somente, a pintar de vermelho semáforos de indicadores e a contribuir para que se continue a avaliar performances com base em percentagens de ANF mal calculadas, nunca se irá ao cerne da questão".
Então e o regulador? Então e o governo? Não há por aí uma CRESAP que anuncia, avalia e recruta diretores e subdiretores gerais? Não deviam os titulares de cargos de direção superior ser avaliados por um estrutura independente, quiçá, saída do regulador e com representantes da tutela e de associações do setor? E não devia existir uma academia de formação do setor, que permitisse habilitar, cada vez mais e cada vez melhor, profissionais que desempenham funções tão críticas, com as competências básicas e essenciais que não os deixassem, a maior parte das vezes, em autogestão?
Enquanto o regulador continuar, tão somente, a pintar de vermelho semáforos de indicadores e a contribuir para que se continue a avaliar performances com base em percentagens de ANF mal calculadas, nunca se irá ao cerne da questão. Isto de Liderar não é para todos...
A ANQEP (Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional) lançou, há dias, um concurso público para a realização de estudos de diagnóstico de necessidades de qualificações e de competências, de âmbito setorial. Alguém “nos” perguntou alguma coisa? “Alguém” disse alguma coisa?
Sei que corro o risco de fazer demasiadas perguntas sem resposta e também não quero constranger, em demasia, o regulador e a tutela, no entanto, como defensor acérrimo e militante do municipalismo e da gestão direta, não posso deixar de admitir que, por vezes, quem pode, manda, mas, nem sempre sabe.
Nuno Campilho é licenciado em Relações Internacionais pela Universidade Lusíada e Pós-graduado em Comunicação e Marketing Político e em Ciência Política e Relações Internacionais. Possui ainda o Executive MBA do IESE/AESE. Foi presidente da União das Freguesias de Oeiras e São Julião da Barra, Paço de Arcos e Caxias e consultor especializado em modelos de gestão de serviços públicos de água e saneamento. Foi administrador dos SMAS de Oeiras e Amadora e chefe de gabinete do Ministro do Ambiente Isaltino Morais. Exerceu ainda funções de vogal do Conselho de Gerência da Habitágua, E.M.. É membro da Comissão Especializada de Inovação da APDA e Diretor Delegado dos SIMAS de Oeiras e Amadora.