Investimento nos TMB é consensual, mas EGF considera estimativas da ZERO “otimistas”
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Investimento nos TMB é consensual, mas EGF considera estimativas da ZERO “otimistas”

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Nas próximas semanas, deverá ser conhecido o resultado do grupo de trabalho, criado em novembro, para desenvolver um Plano de Emergência de Aterros, e o papel que o Tratamento Mecânico e Biológico (TMB) pode desempenhar no desvio de resíduos destas infraestruturas é um dos aspetos cruciais. Numa altura em que o Governo estuda a possibilidade de avançar com novas centrais de valorização energética, a ZERO - Associação Sistema Terrestre Sustentável tem sublinhado que, através do reforço da aposta nos TMB, será possível desviar 2 milhões de toneladas de resíduos de aterro e já fez chegar as suas propostas ao grupo de trabalho e aos agentes do setor. Ao Água&Ambiente Online, os sistemas de gestão de resíduos urbanos (SGRU) concordam com a necessidade de investir nestas infraestruturas, mas a EGF alerta que há desafios a superar e que os dados da organização ambientalista são “bastante otimistas”.  

ZERO: TMB eficientes podem ajudar a desviar 2 milhões de toneladas de resíduos de aterro até 2030

Apesar de o tempo de vida útil dos aterros ser inferior a 5 anos em 18 dos 23 SGRU, cerca de 60% dos resíduos urbanos ainda são enviados para aterro, segundo o último Relatório Anual de Resíduos Urbanos, comprometendo as metas europeias de redução para 10% até 2035.

A ZERO defende que, caso sejam implementadas as melhorias necessárias nos TMB e uma “mudança de paradigma” na recolha seletiva - com porta a porta e/ou contentores de proximidade com acesso condicionado, implementação de tarifários justos (PAYT), atualização dos regulamentos municipais e implementação do Sistema de Depósito com Retorno para embalagens de bebidas -, favorecida pelo aumento dos valores de contrapartida, será possível reduzir essa percentagem para 40% até 2027 e para 20% até 2030. Segundo os cálculos da organização ambientalista, nos próximos cinco anos, a reciclagem com recolha seletiva de alta eficiência pode atingir 40%, enquanto a valorização energética já existente na LIPOR e Valorsul pode absorver 20%. Assim, restariam 40% dos resíduos urbanos a necessitar de tratamento. Desses, os TMB mais eficientes poderiam desviar metade, reduzindo a deposição em aterro para 20% de resíduos inertes por serem tratados com aquela tecnologia. Isso significaria desviar cerca de “dois milhões” de toneladas anuais de resíduos dos aterros “em cinco anos”.

A ZERO reforça ainda que a requalificação dos TMB é essencial para garantir o tratamento adequado da matéria orgânica que resta, evitando a sua deposição inadequada em aterros. “Os principais players do setor de gestão de resíduos concordam que a fração resto não deve conter matéria orgânica não tratada. Se tratarmos toda a matéria orgânica, vamos poder triar muito mais os recicláveis, recuperar muito mais a matéria orgânica do composto e vamos ter um aterro sem cheiro”, justifica.

Para alcançar estes resultados, declarou Rui Berkemeier, é preciso requalificar as unidades existentes, de forma a atingirem uma taxa de desvio de resíduos de aterro de, no mínimo, 50% e a instalação de novas unidades em SGRU que ainda não as têm.

Isto porque, neste momento, os TMB existentes em Portugal apresentam desempenhos díspares. Em média, em 2022, dos 1,7 milhões de toneladas de resíduos indiferenciados que deram entrada em unidades de Tratamento Mecânico (TM) ou TMB, apenas 2,3% de recicláveis foram recuperados, e a percentagem de resíduos de resíduos desviada de aterro com origem em TMB foi de 30%, segundo dados do último Relatório Anual dos Serviços de Águas e Resíduos publicado. A ausência de equipamentos modernos para a triagem e a falta de um tratamento biológico adequado e completo são alguns dos principais obstáculos identificados pela ZERO.

Aplicando as melhores práticas, esta tecnologia de tratamento pode desempenhar um papel fundamental na redução da deposição de resíduos em aterro. A Resialentejo é apontada como um caso de sucesso nesta vertente, tendo conseguido reduzir, através do que entra nos TMB, a deposição de resíduos em aterro de 47% para 31% em apenas um ano, entre 2023 e 2024, e prevendo atingir os 17% até 2026, após instalação de melhores equipamentos de triagem de embalagens, principalmente de plástico, revelou Rui Berkemeier ao Água&Ambiente Online.  “Estes dados vêm reforçar a nossa tese. Ou seja, há possibilidade de estas infraestruturas evoluírem”, afirma. E revela depois: “Todos os players que falámos querem visitar a Resialentejo”.

De resto, segundo a ZERO, o Governo e os agentes do setor estão recetivos a estas propostas. “As entidades com que nos reunimos - APA, Ministério do Ambiente, ESGRA e a EGF - concordam que os TMB devem funcionar no máximo da capacidade e que hoje isso não está a acontecer”, sublinha Rui Berkemeier.  E os números de balanço de massas apresentados pela ZERO “não foram contestados”, garante.

Os TMB também oferecem vantagens significativas face à incineração, vinca ainda a ZERO, destacando-se pela rapidez na resposta ao enchimento de aterros, menores custos de investimento e operação, aproveitamento de infraestruturas existentes e maior flexibilidade, uma vez que são compatíveis com a recolha seletiva. Além disso, são uma opção mais sustentável, emitindo menos gases com efeito de estufa, garantindo maior eficiência energética e permitindo a produção de biometano. De acordo com a ZERO, a APA concordou com esta visão: “A APA disse taxativamente que a incineração não resolvia nenhum problema da emergência dos aterros”, até porque “não vai estar a funcionar nos próximos anos”, revelou Rui Berkemeier.

SGRU apontam desafios e defendem abordagem integrada  

A EGF confirmou ao Água&Ambiente Online que as suas concessionárias estão a realizar investimentos na adaptação dos TMB, prevendo melhorias e expansão destas infraestruturas nos planos de ação elaborados para cumprir os objetivos do PERSU (PAPERSU). Entre as medidas contempladas, estão a reconversão das estações de triagem e a modernização das infraestruturas existentes, estando previstas novas unidades para regiões onde atualmente não existem.

Contudo, a empresa alerta que a implementação desta estratégia enfrenta desafios como a falta de financiamento público e dificuldades na disponibilidade de terrenos, quer seja para construção de novas instalações, quer para a ampliação das existentes.

Quanto aos números avançados pela ZERO, embora não divirja “significativamente dos seus planos”, a EGF considera-os “bastante otimistas”, dado os desafios existentes de escassez de terrenos e falta de financiamento público, mas também pela complexidade dos processos de licenciamento. Além disso, a entrada em vigor de novas regras em 2027, relativas à qualidade do composto produzido a partir da matéria orgânica dos resíduos indiferenciados, pode limitar ainda mais a capacidade de tratamento dos TMB.

A empresa destaca que alguns dos seus TMB, construídos no âmbito do PERSU 2020, enfrentam desafios técnicos para atingir taxas de desvio de aterro superiores a 50%, sendo “necessário reforçar a capacidade de tratamento biológico”. Ressalva, contudo, que nas unidades com digestão anaeróbia - a maioria na EGF -, não é mesmo possível atingir taxas de redução de deposição em aterro tão elevadas devido às exigências de pureza da matéria orgânica a tratar.

Para a EGF, a estratégia de gestão de resíduos urbanos deve passar por soluções integradas, sem “preferências ou preconceitos por determinadas tecnologias, em detrimento de outras”, considerando-as, antes, como “complementares”. 

A ESGRA - Associação para a Gestão de Resíduos prefere não se pronunciar em concreto sobre o tema por integrar o grupo de trabalho criado pelo Governo para desenvolver o Plano de Emergência de Aterros. Não obstante, afirmou Paulo Praça, presidente da ESGRA, num contexto de elevada taxa de deposição em aterro e estagnação da recolha seletiva, a necessidade de otimizar todas as infraestruturas existentes tem vindo a ser amplamente discutida. Para melhorar o desempenho dos TMB, o presidente da ESGRA confirma serem necessários investimentos adicionais e complementares. “A grande dificuldade prende-se com a contaminação dos resíduos à entrada devido à presença dos biorresíduos que deviam ser recolhidos seletivamente ou valorizados na origem mediante compostagem doméstica ou comunitária”, complementa.

O que a associação defende é uma abordagem ampla, que “otimize o desempenho de todas as infraestruturas existentes, de modo a maximizar os investimentos realizados que permitam melhorar o desempenho do país”.

Financiamento precisa-se

A falta de disponibilidade de financiamento é um dos principais entraves para um reforço da aposta nos TMB.

Os programas regionais no âmbito do Portugal 2030 contemplam linhas de apoio para a modernização destas infraestruturas, mas o volume de investimento inscrito nos PAPERSU na vertente em alta é muito superior aos apoios disponíveis.

Rui Berkemeier, da ZERO, reforça que o financiamento comunitário deve ser mobilizado para garantir que os TMB existentes atinjam o seu potencial máximo, possibilitando, nomeadamente, a instalação de novos equipamentos de separação ótica, balísticos e crivos mais eficientes, pois muitas unidades ainda operam com tecnologia desatualizada: “É irracional termos infraestruturas construídas e não lhes darmos os equipamentos necessários para operar com eficiência”, afirmou. Também são necessários fundos para reforçar o tratamento biológico, permitindo um melhor aproveitamento da matéria orgânica e evitando a deposição de resíduos fermentáveis em aterro.

O aumento das contrapartidas para a triagem de materiais recicláveis a partir de janeiro de 2025 foi elencado pela EGF como um fator que pode tornar estas infraestruturas uma solução mais atrativa. Apesar disso, a empresa alerta que o aumento dos requisitos de retoma dos recicláveis pode elevar os custos de separação, reduzindo o impacto positivo das contrapartidas.

Setor aguarda decisões

Com o grupo de trabalho criado no final novembro de 2024 para desenvolver um Plano de Emergência de Aterros a elaborar propostas, as decisões tomadas nas próximas semanas serão determinantes para definir o papel dos TMB na gestão de resíduos em Portugal.

A ZERO, pelos argumentos e dados referidos, tem defendido com determinação a valorização da oportunidade de investimento em TMB para promover a redução da deposição de resíduos urbanos em aterro, em detrimento da construção de novas centrais de valorização energética.

O setor aguarda, pois, com expectativa as recomendações do grupo de trabalho que deverão clarificar a estratégia futura para estas unidades e as condições de financiamento disponíveis para a sua modernização e expansão.

O Ministério do Ambiente e Energia não respondeu em tempo útil às questões colocadas pelo Água&Ambiente Online sobre a visão do Governo a respeito deste tema.

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