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Governo adia votação do fim da isenção do ISP para biocombustíveis avançados

Governo adia votação do fim da isenção do ISP para biocombustíveis avançados

A votação para a revogação da isenção do Imposto Sobre Produtos Petrolíferos (ISP) aplicável a biocombustíveis e gases de origem renovável foi adiada, esta quinta-feira, durante a sessão plenária na Assembleia da República. O deputado Alberto Fonseca, do PSD - Partido Social Democrata, anunciou, já no final da sessão, que foi requerida baixa da proposta, sem votação, após críticas generalizadas da oposição sobre o recurso a uma autorização legislativa quando está em causa matéria que devia ser debatida no Parlamento. Vários partidos acusaram o Governo de pretender governar por decreto, recusando-se a dar um "cheque em branco" em matéria fiscal.

A medida está inserida na Proposta de Lei n.º 15/XVI/1.ª, que visava alterar disposições do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo (IEC) e incluía a eliminação de isenções criadas em 2021, nomeadamente a revogação do n.º 11 do artigo 90.º do mesmo Código, consideradas pelo Executivo como desvirtuadas no seu impacto ambiental e económico. Segundo a Secretária de Estado dos Assuntos Fiscais, Cláudia Reis Duarte, a isenção incentivou a importação massiva de biocombustíveis, principalmente da Ásia, que não garante sustentabilidade e apresenta riscos de fraude.

Problemas da isenção atual

Na apresentação da proposta, Cláudia Reis Duarte destacou que a isenção fiscal tem promovido um aumento significativo das importações de biocombustíveis baseados em efluentes de óleo de palma, com uma elevada pegada carbónica, em detrimento da produção nacional, citando dados revelados ontem pelo Água&Ambiente Online.

A Secretária de Estado sublinhou o alerta da Comissão Europeia sobre o risco de fraude relacionado com a utilização de óleo de palma quase virgem, cuja produção contribui para a desflorestação, sobretudo no sudeste asiático.

A isenção de ISP, medida originalmente concebida para estimular a produção doméstica, promover a economia circular e diversificar as matérias-primas residuais, não alcançou, por isso, os seus objetivos. Pelo contrário, enfatizou Cláudia Reis Duarte, a isenção fiscal está a financiar um modelo de produção que não respeita os critérios de sustentabilidade defendidos em Portugal.

Apesar de as metas de incorporação de biocombustíveis no país terem sido amplamente ultrapassadas - atingindo 5,4% em 2024, face ao objetivo europeu de 0,7% -, o incentivo fiscal não impulsionou o setor nacional. "Em 2020, a produção nacional representava cerca de 85% do mercado. Em 2024, os dados provisórios indicam que as importações de biocombustíveis avançados correspondem a cerca de 50% do mercado”, afirmou a governante. O impacto ambiental destas importações torna a isenção injustificável, sublinhou.

O Governo defende que a eliminação da isenção é igualmente necessária para alinhar a política fiscal com as práticas europeias, dado que esta medida é uma "singularidade portuguesa" sem equivalente noutros países da União Europeia.

Oposição contesta proposta

Os partidos da oposição desaprovaram veementemente a proposta.

Para Carlos Brás, do PS - Partido Socialista, o seu conteúdo representa “nada mais, nada menos, do que um aumento da carga fiscal”, consistindo numa subida “de impostos camuflada”, que vem agravar o preço dos combustíveis. Segundo o deputado, estão em causa os 100 milhões de euros adicionais de ISP previstos no Orçamento do Estado e o PS não dará aval à medida.

Ainda da parte dos Socialistas, ouviu-se também a contestação de Hugo Costa, que avisou que o fim da isenção do ISP pode representar um “risco de não cumprimento dos objetivos verdes assumidos com a União Europeia”, designadamente quanto à incorporação de biocombustíveis. O deputado acusou o PSD de propor uma medida que pode enfraquecer a capacidade industrial e comprometer os esforços para fortalecer a economia circular.

Já Eduardo Teixeira, do Chega, considerou que a eliminação da isenção contradiz os esforços de descarbonização do país. "Não é a altura certa para onerar ainda mais os portugueses. Num contexto geopolítico em que a União Europeia procura emancipar-se da dependência energética de países terceiros, este Governo quer desincentivar os investimentos no setor e a respetiva cadeia de valor e colocar um travão nos esforços de descarbonização nacionais”, justificou. O deputado destacou adicionalmente a contradição de se manterem apoios fiscais para combustíveis fósseis, como os descontos na taxa de carbono.

Por seu lado, Bernardo Blanco, da Iniciativa Liberal, expressou preocupações sobre o aumento do preço dos combustíveis, mas questionou o facto de a fiscalização da importação e da produção nacional não ser “exatamente a mesma”.

Após acusar o Governo de evitar o debate aprofundado de matérias fiscais no Parlamento, Paula Santos frisou que o PCP - Partido Comunista Português defende uma análise mais detalhada sobre o uso de recursos naturais para a produção destes combustíveis. Para o PCP, a prioridade deve ser utilização de “resíduos agrícolas e florestais, em vez de solos agrícolas”.

Isabel Pires, do Bloco de Esquerda, também levantou “muitas dúvidas” ao proposto e reforçou a visão crítica do partido em relação aos biocombustíveis: estes devem apenas “ser encarados como uma opção de recurso absolutamente transitória, pois estão longe de estarem isentos de riscos ambientais”. E adicionou que a autorização legislativa não resolve os problemas de sustentabilidade nem combate os riscos de fraude associados ao uso de óleo de palma.

A deputada do PAN - Pessoas-Animais-Natureza, Inês Sousa Real, apontou que o foco devia ser o cumprimento da Lei de Bases do Clima, com prioridade para o fim do uso de óleo de palma. Os biocombustíveis podem ajudar a reduzir as emissões, mas não à custa de ignorar as questões ambientais de fundo, declarou.

Já Paulo Muacho, do Livre, salientou a necessidade de diferenciar os tipos de gases renováveis e advogou um debate mais criterioso, que permita uma discussão detalhada no Parlamento: “Este fim da isenção inclui também os gases de origem renovável e, tanto na exposição de motivos, como na sua intervenção inicial, não foi feita nenhuma referência a isso”.

Gases renováveis podem escapar ao fim da isenção

Cláudia Reis Duarte garantiu que o Governo está disposto a ajustar a proposta em sede de especialidade, para incluir a diferenciação entre biocombustíveis e gases renováveis, como o biometano e o hidrogénio verde.

Anteriormente, o deputado Hugo Oliveira, do PSD, já tinha trazido a debate a necessidade de fazer esta distinção para assegurar que a isenção para os gases renováveis é mantida, sublinhando os seus impactos positivos em setores como a energia e a agricultura.

Em resposta a outras questões suscitadas pelos deputados, a Secretária de Estado dos Assuntos Fiscais assegurou que a revogação da isenção tem um impacto económico marginal no preço final dos combustíveis e não colocará em risco o cumprimento das metas de incorporação de biocombustíveis.

Sobre a fiscalização, reconheceu as limitações da verificação documental de biocombustíveis importados.

Por fim, sustentou que a revogação da isenção permitirá devolver 100 milhões de euros ao Orçamento do Estado.

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