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SPV impugna despacho do Governo com novos valores de contrapartida para reciclagem de embalagens

SPV impugna despacho do Governo com novos valores de contrapartida para reciclagem de embalagens

A Sociedade Ponto Verde (SPV) impugnou o despacho do Governo que define os valores das contrapartidas a pagar pela reciclagem de embalagens, soube o Água&Ambiente Online em primeira mão. A entidade gestora já entrou com uma ação no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra para contestar a medida.

A SPV justifica esta ação judicial como um alerta para a necessidade de um sistema de gestão de embalagens mais eficiente e alinhado com as metas ambientais nacionais e europeias. “A forma como esses valores são calculados tem de respeitar a legislação e os procedimentos comunitários e nacionais, e devem ainda ser apurados por entidades independentes”, afirma a SPV, considerando que tal não ocorreu no estudo que fundamentou a decisão governamental.

A entidade gestora reconhece a necessidade de rever os valores em causa e afirma ter solicitado essa revisão a sucessivos Governos. Contudo, critica “a decisão unilateral do atual Governo de avançar com um modelo de cálculo que não tem em conta a realidade que se vive nos Sistema de Gestão de Resíduos Urbanos (SGRU)”. A entidade alerta que muitos destes sistemas não dispõem de mecanismos para apurar com precisão os custos reais da recolha e triagem das embalagens, o que pode comprometer a eficiência do setor e o cumprimento das metas ambientais.

“Nos últimos cinco anos as Entidades Gestoras do SIGRE, SPV, NOVOVERDE e ELECTRÃO pagaram cerca de 500 milhões de euros ao sistema.  Em 2025, estima-se que o sistema de reciclagem de embalagens em Portugal venha a custar aos portugueses 235 milhões de euros, mais 96% do que em 2024”, adiantou ainda a entidade gestora.

Apesar da impugnação, a SPV assegura que continuará a cumprir os pagamentos aos sistemas municipais e multimunicipais de acordo com os valores estipulados no despacho, em vigor desde 1 de janeiro de 2025.

Aumento dos valores de contrapartida em números

Os novos valores foram estabelecidos pelo Despacho n.º 12876-A/2024, publicado em outubro, e representam um aumento significativo face aos montantes praticados nos últimos meses de 2024. Recorde-se que estes valores não eram revistos há oito anos.

Os valores de contrapartida para a recolha seletiva são diferenciados consoante a tipologia da área de intervenção de cada sistema - rural, medianamente urbano ou urbano.

Para alguns materiais, os incrementos são particularmente expressivos. Por exemplo, os valores de contrapartida para a recolha seletiva de vidro nos SGRU rurais terão um aumento de 135,6% em 2025, passando de 73 €/tonelada para 172 €/tonelada. Já o papel/cartão subiu de 290 €/t para 493 €/t, um aumento de 69,9%.

A visão do setor: ESGRA expressa concordância, Electrão alerta para impactos

Os novos valores de contrapartida (VC) são vistos como uma conquista pela ESGRA (Associação para a Gestão de Resíduos), mas geram fortes críticas de outra entidade gestora de embalagens, o Electrão, que alerta para impactos negativos nos ecovalores pagos pelos embaladores aderentes, apurou o Água&Ambiente Online junto de Paulo Praça, presidente da direção da ESGRA, e de Pedro Nazareth, CEO do Electrão. Enquanto a ESGRA considera a atualização necessária para corrigir um défice tarifário e reforçar o princípio do poluidor-pagador, o Electrão acusa o processo de falta de transparência e alerta para um aumento expressivo dos custos das empresas.

Segundo a ESGRA, este ajustamento visa corrigir anos de defasagem dos valores de contrapartida, que permaneciam inalterados desde 2016, apesar da inflação e do aumento dos custos operacionais. "Foi com satisfação que vimos isto ser aprovado, pois constitui um estímulo aos desafios que temos pela frente", afirmou Paulo Praça, presidente da ESGRA, acrescentando que "termos passado praticamente uma década sem aumento não fazia sentido”, e gerou um défice tarifário que precisava ser corrigido.

A ESGRA considera que os novos valores cobrem de forma justa os custos dos sistemas de gestão de resíduos urbanos. Paulo Praça destaca que "faltará agora avaliar os novos desafios, como as novas especificações técnicas” e o impacto nos centros de triagem, mas o “modelo é um bom ponto de partida". Acrescenta ainda que um dos impactos imediatos será no vidro, material que tinha um valor de contrapartida muito baixo e que agora recebe um estímulo para aumentar a recolha.

Já o Electrão adota uma postura crítica. "O impacto económico nas empresas através das prestações financeiras (Ecovalor) é mesmo muito expressivo e a previsibilidade orçamental das empresas foi totalmente atropelada pela forma como decorreu o processo que levou à fixação destes valores", afirmou Pedro Nazareth, CEO da entidade gestora. Para o Electrão, a fixação dos valores de contrapartida não permitiu avaliar devidamente a sua adequação ao contexto setorial. "Sem fixar indicadores de qualidade de serviço e mantendo-se uma determinação de valores médios por tipologia de SGRU, é impossível discutir a adequação do aumento", reforça Pedro Nazareth.

Além disso, a entidade alerta para possíveis reações adversas dos embaladores aderentes. "Este salto de valores histórico pode ter reações que neste momento não conseguimos antecipar", afirmou o CEO. O Electrão também manifesta preocupação quanto à forma como serão financiados os investimentos necessários para cumprir metas ambientais. "Não estamos nada convencidos de que o financiamento das componentes de investimento relativas a embalagens seja assegurado através de um estudo posterior de valores de contrapartida", alerta Nazareth, já que, justifica, o aumento das contrapartidas para 2025 visa corrigir desequilíbrios económicos identificados há três anos, quando, paralelamente, o setor debate o plano de investimentos de 4 mil milhões de euros para resíduos urbanos, essencial para cumprir as metas do PERSU2030.

Apesar das críticas, o Electrão, ao contrário da SPV, descarta, para já, uma contestação judicial da tabela. "Mais do que contestar, estamos empenhados em propor e discutir modelos alternativos de funcionamento do sistema com os SGRU, municípios e diferentes parceiros", garantiu Pedro Nazareth. A estratégia da entidade passa por um esforço de consenso setorial alargado, num contexto em que a Secretaria de Estado do Ambiente tem promovido diálogos sobre o tema.

Por outro lado, a ESGRA destaca que a nova tabela corrige uma situação injusta e está de acordo com o princípio do poluidor-pagador. "Os municípios não devem continuar a suportar custos que são da responsabilidade dos produtores e embaladores. Este modelo reforça essa correção e dá maior previsibilidade aos SGRU", defende Paulo Praça.

O futuro do SIGRE e as novas regras

A atualização dos valores de contrapartida traz desafios para o funcionamento do Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagens (SIGRE). Segundo Paulo Praça, o aumento "trouxe motivação para trabalhar mais e melhor a partir deste ano", pois permitirá um equilíbrio financeiro mais justo para os SGRU. "Estávamos a assistir a um cenário em que havia mais ecopontos, mais recolhas, mais triagem, mas os valores de contrapartida não acompanhavam esse crescimento", explica.

Já o Electrão insiste na necessidade de uma maior previsibilidade e no envolvimento mais direto das entidades gestoras no planeamento das metas ambientais. "As opções tecnológicas, os riscos associados e os investimentos necessários precisam de um consenso setorial maior", defende Pedro Nazareth, que “a Secretaria de Estado do Ambiente está de forma empenhada a promover”.

O setor de resíduos urbanos entra assim num novo ciclo, com um reajuste significativo dos valores pagos às SGRU e um impacto direto nos ecovalores suportados pelos embaladores. Resta saber se os ajustes financeiros garantirão um equilíbrio sustentável entre os interesses das entidades gestoras, dos municípios e das empresas do setor.

O debate promete continuar nos próximos meses e, sobre este tema, ainda há próximos capítulos muito em breve, já que a ERSAR vai assumir o comando da definição dos valores de contrapartida já a partir do final de março, como define o UNILEX.

Nesse sentido, o regulador já terá feito uma primeira abordagem ao setor, revelou Paulo Praça ao Água&Ambiente Online: "Já houve um contacto preliminar para a definição de novas metodologias, mas ainda nada de concreto. Para começarem a fazer a definição da transição", nomeadamente a propósito dos novos mecanismos de alocação e compensação.

A ERSAR já publicou um aviso, a 24 de janeiro, sobre a abertura do procedimento para a elaboração do regulamento do mecanismo de alocação e compensação, que servirá para definir as metodologias dos pedidos de retoma.

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