2025: o ano em que os projetos de hidrogénio soçobram?
Quando, em fevereiro de 2023, António Costa, na altura, Primeiro-Ministro, fechou a cerimónia de assinatura dos 25 contratos para a produção de hidrogénio no âmbito do I Aviso do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), estava convencido de que o seu Governo tinha garantido as bases para a expansão deste setor em Portugal. Visivelmente entusiasmado, afirmou que a [produção de hidrogénio em Portugal] “é um excelente exemplo de como com boas políticas públicas, objetivos claros, regras regulatórias estáveis e transparentes, a agilização e a simplificação dos processos de licenciamento e a devida combinação entre o apoio público e a capacidade de mediação do setor privado, nós conseguimos transformar o perfil da economia portuguesa, designadamente num setor tão crítico como o da energia”.
O discurso não terá sido certamente escrito por ele, mas António Costa disse-o, sem o ler, com profunda convicção. E, para mal do país, o então Primeiro-Ministro estava enganado.
Hoje sabemos que a realidade do desenvolvimento da fileira do hidrogénio por si deixada não podia ter ficado mais longe daquela descrição. A avaliação da “boa política pública” está por fazer (e esperemos que, por uma vez, se faça mesmo), mas parece evidente que a expansão do setor do hidrogénio em Portugal não acontecerá até 2030. A execução de projetos de produção de hidrogénio lançados no âmbito dos dois avisos do PRR transformou-se num verdadeiro calvário e 2025 pode mesmo ser o ano em que os projetos soçobram.
(...) parece evidente que a expansão do setor do hidrogénio em Portugal não acontecerá até 2030
O principal problema é a falta de tempo para os executar. Por força das regras do PRR, todos os projetos têm de estar executados até 31 de dezembro de 2025, mas, sem leilões, peça essencial para a sua viabilização, nada feito. A Resolução do Conselho de Ministros 63/2020, aprovada pelo segundo Governo de António Costa, 3 anos antes da assinatura dos contratos, previa que os leilões fossem lançados à cadência de um por ano, entre 2020 e 2030, mas, à data de hoje, nenhum foi ainda concretizado, e já passaram 4 anos! E os projetos que concorreram ao segundo aviso confrontam-se com os mesmos problemas.
Os projetos eram de facto importantes para o país. Só o primeiro aviso envolvia um investimento total de 237 milhões de euros, segundo o próprio Primeiro-Ministro revelou na ocasião, entre 102 milhões de euros de comparticipação PRR e um investimento privado de 135 milhões de euros !
Ora, os promotores precisam de assegurar o escoamento do seu produto para garantir financiamento e, para tal, precisam de apresentar clientes firmes e credíveis. Sem leilões, não há Final Investment Decision.
Preocupados, alguns, desesperados, outros, os promotores foram ao Ministério do Ambiente e Energia no final do ano, mas o que aí ouviram do Diretor do Fundo Ambiental, Marco Rebelo, não os deixou otimistas: “o prazo é mesmo dezembro e, sem decisão do Conselho [da União Europeia ], não há perspetiva de alteração”.
Sem leilões, não há Final Investment Decision
O balanço que se fez na rua do Século, no passado dia 10 de dezembro, foi só por si esclarecedor do ponto de situação geral: uma execução financeira de apenas 5 por cento e atrasos significativos no arranque e desenvolvimento dos projetos. Já se fala na reafetação de verbas para outros investimentos. Nada que não tivéssemos visto acontecer com os projetos para a produção de gases renováveis do POSEUR, os pioneiros. Também estes não saíram do papel e as verbas disponíveis foram reafetadas às obras do metro.
É pena, porque poderia ser mesmo uma oportunidade, como disse António Costa, para transformar o perfil da economia portuguesa num setor tão crítico para o país como o da energia. Mas, para que assim fosse, teria sido necessário ter concebido um plano com princípio, meio e fim. Afinal, o básico. E o básico é o que falta quase sempre em Portugal.