A oportunidade de centrais eólicas offshore

A oportunidade de centrais eólicas offshore

O documento estratégico português para a energia, o Plano Nacional para Energia e Clima 2030 (PNEC 2030, 10 julho 2020) refere, para 2030, a meta de 300 MW (0,3 GW) de eólica offshore (correspondente à capacidade do cabo submarino já instalado na zona piloto marítima de Viana do Castelo).

Entretanto, a 23 de janeiro deste ano, o Primeiro Ministro anuncia que até ao próximo mês de setembro irá ser lançado o primeiro leilão de eólica offshore e que o objetivo de Portugal é atingir 10 GW em 2030.

Há uma contradição entre a previsão do PNEC e o anúncio do Governo quanto aos objetivos de eólica offshore

Perante a contradição entre a previsão do PNEC e o anúncio do Governo quanto aos objetivos de eólica offshore, a questão que se coloca é: porque é que o Governo mudou tão radicalmente de opinião em tão pouco tempo? O investimento necessário seria de €30b, mais do dobro do que foi investido em duas décadas em toda a eólica terrestre, para além de exigir um investimento na rede de transporte elevadissimo. Será que é mesmo isto que o Governo quer?

Para tentar responder a esta pergunta recorro a alguns factos e observações.

Em Espanha, o objetivo  de eólica offshore para 2030 é de entre 1 a 3 GW de acordo com a “Hoja de Ruta para el desarrollo de la Eólica Marina y de las Energías del Mar en España, dez. 2021”.    

Em termos relativos, a meta do PNEC português, assumindo uma relação de 1 para 5, está alinhada com a meta de Espanha, embora esta última seja um pouco mais ambiciosa, o que se pode entender pois Espanha dispõe de duas zonas de excelente potencial, comparativamente a Portugal, que são as ilhas Canárias e o noroeste da península.

Por outro lado, no passado dia 22 de janeiro houve necessidade de um deslastre (redução forçada) de 5 GW de potência eólica em Espanha por excesso de produção fluente (solar e eólica) face ao consumo, mesmo em situação de exportação máxima para Portugal (3 GW) e para França (2,5 GW).

Como está prevista, tanto em Portugal como em Espanha, a duplicação, até 2030, da atual potência renovável instalada (eólica terrestre e solar), é uma certeza matemática que o volume de deslastre de geração renovável irá aumentar de forma significativa até 2030, o que influenciará de forma determinante a rentabilidade de alguns projetos de renováveis.

Para manter o volume deste deslastre num patamar aceitável a procura teria que aumentar de forma nítida, mas não creio que isto suceda, pois o aumento da eletrificação irá ser, em parte, compensado pelo aumento da eficiência. 

É neste enquadramento que surge o anúncio do Governo de lançar o leilão de eólica offshore, que se adicionaria aos objetivos de eólica on-shore e de solar inscritos no PNEC.

"Não encontro racional económico para a concretização de até 10 GW de eólica offshore sem que antes se tenha explorado o potencial da eólica terrestre e se tenham desenvolvido meios de gestão do sistema flexíveis e de armazenamento eficaz"

Há uma aparente contradição que não vejo explicado pelo Governo. Para onde vão ser escoados estes 10 GW?

Para exportação não, porque Espanha tem um portfólio muito parecido com o nosso. O armazenamento também não dará resposta porque nada de novo está programado até 2030. Para consumo não, exceto a pequena parcela utilizada para a produção de hidrogénio verde. Então, a resposta será: muito do potencial de produção das renováveis vai ser deslastrado por excesso face ao consumo.

Outra alternativa teoricamente possível seria o não desenvolvimento de novos projetos de eólica terrestre e a sua progressiva substituição por eólica marinha. Mas creio que não será esta a “ideia” do Governo pois a eólica terrestre tem mais valias relativas que não podem ser descuradas na economia do País. De facto, a unidade de energia elétrica produzida pela eólica terrestre é cerca de 2 a 3 vezes mais barata do que a da eólica offshore flutuante, sendo também de realçar que a rede elétrica já está praticamente toda adaptada para a sua receção e distribuição, situação que não se verifica para a eólica offshore que exigiria investimentos avultadas em redes.

Em síntese, não encontro racional económico para a concretização de até 10 GW de eólica offshore sem que antes se tenha explorado o potencial da eólica terrestre e se tenham desenvolvido meios de gestão do sistema flexíveis e de armazenamento eficaz, que evitem avultados deslastres de geração.

É pois de extrema importância que o Governo construa uma visão de largo prazo, consistente e verdadeiramente estratégica para o Setor, sem recorrer a medidas pontuais de carácter mais ou menos bombástico e proclamatório, de modo a tornar o nosso sistema elétrico mais resiliente e competitivo e que possa servir de alavanca à economia, e não o contrário.

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