A revisão do PNEC

A revisão do PNEC

O Governo colocou em consulta prévia a revisão do Plano Nacional Energia Clima (PNEC2030), que decorreu até 14 de abril.

O PNEC é um documento que expressa a ambição de cada País na rota da transição energética sendo prevista, de acordo com o artigo 14.º do Regulamento (UE) 2018/1999, a obrigatoriedade da sua revisão periódica, estando definida a entrega do projeto de revisão do plano até 30 de junho de 2023.

A definição dos objetivos deverá estar suportada, naturalmente, por adequadas e poderosas ferramentas de simulação mas, sobretudo, deve privilegiar a mais eficaz trajetória económica, visto que a energia é um dos fatores determinantes na competitividade da nossa economia.

A rápida evolução tecnológica e a complexa interação entre os vários fatores que influenciam a transição energética torna a sua modelação complexa e justifica a sua revisão e calibração em intervalos de tempo relativamente curtos.

Como exemplo da interação entre setores, pode citar-se a interdependência entre a mobilidade elétrica e o sistema elétrico. De facto, o ritmo de crescimento da mobilidade elétrica irá induzir novas necessidades de produção de energia elétrica e, em sentido inverso, a própria evolução dos modos e custos de produção de eletricidade, irá incentivar em maior ou menor grau o ritmo da eletrificação da mobilidade.

O hidrogénio é outro exemplo paradigmático da interação entre setores. Quanto mais hidrogénio verde se incorporar na economia mais produção de eletricidade será requerida, a qual exige a expansão das redes elétricas e de gás, devendo pois ser encontrado um ponto de equilíbrio económico para esta dualidade de investimentos.

Por seu lado, as redes elétricas estão no centro desta transição. Elas têm de ser assegurar os fluxos de eletricidade entre a multiplicidade de produtores, quer sejam os grandes centros de geração ou as pequenas unidades localizadas perto das habitações, e os consumos. Mas esta transição só é possível com a disseminação das TI (tecnologias de informação), facto que acrescenta complexidade e custo. Note-se que, se tradicionalmente os maiores custos do sistema elétrico estavam nos fatores de produção, assiste-se agora a uma tendência de mudança, passando as redes a representar uma fatia cada vez importante dos custos do sistema elétrico.

É pois fundamental que o PNEC consiga acomodar a efetiva simulação integrada da interdependência entre setores e não resulte apenas da agregação de resultados das diferentes análises parcelares de cada um dos setores. 

Os atores do sistema elétrico estão na expetativa de quais serão as novas metas nacionais do PNEC para 2030 pois os sinais do tecido empresarial  têm mostrado que os objetivos definidos no PNEC de 2021 precisam ser recalibrados.

A produção Solar Fotovoltaica (PV) é um dos exemplos. O PNEC em vigor estimou que o valor objetivo de PV em 2030 seria de 9GW, dos quais cerca de 2GW em geração distribuída. E essencialmente valorizou a realização de leilões, afirmando que essa era a melhor estratégia para defender os consumidores. Mas o que se verifica é que a atribuição de novas autorizações tem sido feita ao abrigo da “lei geral” e já ultrapassa os 20GW, valor muito para além do objetivo traçado no PNEC. 

Assim, é essencial que as metas para este objetivo sejam revistas, não só nos respetivos montantes como também nos modelos de implementação.

Outra área cujas orientações foram radicalmente alteradas pelo Governo foi a da energia eólica. Dizia-se no PNEC sobre a energia eólica onshore que “Portugal dispõe ainda de um significativo potencial eólico (onshore) por explorar, ao mesmo tempo que importa dar atenção aos atuais parques eólicos, dando-lhes as condições para se tornarem mais competitivos ...”. Mas, neste campo, as medidas tomadas pouco têm contribuído para o aproveitamento desse significativo potencial por explorar. De facto, a figura de reequipamento, criada pelo DL nº 15/2022, por ter limitado a 20% o aumento de potência das centrais eólicas, estrangula o real e efetivo potencial de expansão que existe, visto que a maioria das centrais, utilizando máquinas modernas e de melhor desempenho, tem viabilidade de expansão muito para além dos 20% e que, nas condições impostas pelo DL nº 15/2022, fica condicionado e estrangulado por mais 15 ou 20 anos. Será mesmo este o caminho que o Governo quer trilhar?

A ambição do PNEC em atingir, em 2030, cerca de 9GW de eólica onshore está pois comprometida. Talvez sentindo a exiguidade da figura de reequipamento criada para a eólica on-shore, o Governo anunciou que irá desenvolver a energia eólica marítima off-shore, prometendo lançar um concurso para 10GW até 2030. 

Mas um objetivo desta magnitude não deve ser estabelecido de forma leve, sem uma análise das suas implicações técnicas e económicas na exploração dos nossos recursos oceânicos e na estrutura de custos do sistema elétrico. Um objetivo desta magnitude exige a realização de análises aprofundadas do sistema elétrico nacional, que possam demonstrar a viabilidade das metas do PNEC. Muito recentemente, houve mais uma notícia: a de que foram alocadas mais verbas do PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) para o estudo de identificação do potencial eólico off-shore. E é precisamente por aqui que se deve começar: primeiro identificar o potencial, depois avaliar as consequências em termos sistémicos e só depois decidir o modo de avançar.

É por estes motivos, e muitos outros que não cabem neste pequeno texto de opinião, que os agentes do sistema energético estão aguardando, com enorme expetativa, o resultado do exercício de revisão do PNEC2030.

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