
Como passar da realidade dos resíduos à dinâmica dos recursos?
O projeto do PERSU 2030 revela as preocupações do setor, analisa os desafios para a próxima década, e opta por um conteúdo semelhante ao PERSU 2020 e PERSU 2020+, quer na forma como se apresenta, quer nas medidas preconizadas, primando, desta forma pela continuidade da linha estratégica para o setor. Porém, esta mesma consistência do PERSU 2030 com os anteriores planos, constitui um obstáculo ao level up do setor, que se pretende alcançar a todo o custo pelas metas ambiciosas. Respondendo à questão que foi colocada, se encarar os resíduos como recursos na ótica da sustentabilidade ambiental é uma necessidade evidente e inadiável, então como é que o PERSU 2030 nos ajuda - ao País, aos Sistemas, aos Municípios, às instituições, às empresas e aos Cidadãos, a implementar esse movimento, a atingir os exigentes objetivos de economia circular e as metas ambientais em apenas 7 anos? O prazo é manifestamente pouco – para cumprir esta missão em apenas 7 anos não há tempo a perder nem oportunidade para especulações. Pelo contrário, há que avançar com determinação, com soluções viáveis, meios e modalidades de financiamento acessíveis e sustentáveis, agregando todos os intervenientes no processo nos objetivos que nos unem.
Sobre metas e responsabilidade
Sabemos que, globalmente, as metas definidas em planos anteriores não foram superadas. Temos de ter presente que, atualmente, estamos já a ser criticamente observados e avaliados pelas instâncias e instituições Europeias e Nacionais e há consequências para os incumprimentos aos objetivos estipulados. Queremos todos sair desta rota de insucesso do País. Para isso é necessário reconhecer o que correu bem e poderia ter corrido melhor em planos anteriores, ter um novo plano realista, agregador e com soluções exequíveis nos prazos que temos pela frente.
Sobre a fração resto
A fração resto é um dos temas críticos para o sucesso do país na frente ambiental. Tal como no PERSU 2020+, também neste PERSU 2030 se abordam temáticas como novas soluções de tratamento, nomeadamente a gaseificação/pirólise de resíduos.
A EGF reiterando neste novo plano a contribuição que apresentou na pronúncia ao PERSU 2020+, refere que sendo soluções com um potencial relevante para o futuro, carecem de maturidade tecnológica e/ou fundamentação técnica mais aprofundada para serem consideradas como alicerces para o tratamento da fração resto. Terá que haver alternativas disponíveis e acionáveis que gerem impacto nesta área.
De novo os CDR’s e outras alternativas dependentes da ação de terceiros, não pertencentes ao setor dos resíduos, são apresentados como solução. Só que essa solução não é devidamente materializada no plano, nem é dado a conhecer como é que a industria cimenteira, o destino mais próximo, irá ser parte ativa nem como é que os custos serão distribuídos.
Tal como no PERSU 2020, a solução para a fração resto está de novo fora do setor. A gestão desta fração, a par com a prevenção, foram dos maiores insucessos do PERSU 2020, tendo resultado em instalações que praticamente nunca funcionaram.
Teme-se que a mesma receita se traduza no mesmo resultado. Importar a solução para dentro do setor seria uma garantia de que existiriam medidas a ser implementadas no terreno e de cumprimento de metas. Assim será apenas uma incógnita.
Hora de assumir e executar – é tempo de falar em SOLUÇÕES
Temos de assumir que os objetivos traçados no passado não foram cumpridos e de perceber o porquê, com mais transparência. Sabemos hoje que os valores de contrapartida do SIGRE não cobrem os custos reais da recolha e tratamento de resíduos para garantir o cumprimento de metas; também sabemos que a responsabilidade alargada do produtor é concretizada pela metade e que muitas embalagens não contribuem para a sua quota de responsabilidade no sistema.
São problemas totalmente diagnosticados e os princípios já enraizados. Para cumprirmos as metas de reciclagem nada pode ficar de fora. As soluções terão que ser agregadoras e com a marca de incentivo claro.
Sobre Energia e resíduos
Seriam muitos mais os pontos a explorar, mas este tema e no contexto atual que vivemos merece uma atenção especial. Numa fase em que todos os países se questionam sobre as origens e a diversidade das origens da energia que consomem, não podemos deixar de aplaudir a reintrodução de uma tarifa bonificada da venda de energia em instalações que utilizem fontes de energia renovável a partir de resíduos urbanos, seja biometano de aterro seja por gás de compostagem anaeróbia, e o reconhecimento da necessidade de fortes investimentos na manutenção das nossas duas incineradoras. À luz dos mais recentes acontecimentos, e considerando a falta de soluções de valorização para vários tipos de resíduos, seria avisado considerar os resíduos urbanos como fonte de energia contínua numa estratégia nacional que pode potenciar infraestruturas existentes que tem potencial para contribuir com uma maior quota parte na estratégia nacional. Porque Sol temos muito, mas não temos nas 24 horas do dia; o vento nem sempre sopra; e a água, escasseia com frequência, como se constatou recentemente. Já os resíduos urbanos, são locais e têm base sustentável. São muitas as soluções que poderemos implementar para produzir mais energia, umas mais futuristas outras mais conservadoras, mas estamos seguros que podemos contribuir para a diversificação energética que o País necessita.