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Como reduzir para 10% a deposição de resíduos em aterro até 2035?

Como reduzir para 10% a deposição de resíduos em aterro até 2035?

A importância dos municípios

2025 é ano de eleições autárquicas, momento em que o debate político pode resvalar para excessos e comprometer os desafios urgentes que temos pela frente nesta área.

O setor dos resíduos carece de previsibilidade nas políticas e na regulação e não avança sem o compromisso efetivo dos municípios.  Neste sentido, a ANMP devia lançar o repto aos partidos e movimentos independentes que se candidatam a assumirem um pacto para a sustentabilidade ambiental que priorize a gestão de resíduos, a qualidade da água e o tratamento de águas residuais, a qualidade do ar e dos solos.

Breve diagnóstico da situação atual

Portugal produziu cerca de 5 milhões de toneladas de RU em 2023, o que corresponde a 505 kg/hab/ano, ou seja, a uma produção diária de 1,4 kg por pessoa.

Só 32% do lixo é preparado para reciclagem, longe da meta de 55% em 2025, 60% em 2030 e 65% em 2035.

59% dos nossos resíduos foram enviados para aterro, o que coloca o país entre os piores desempenhos na UE.

De RNU, 1,9 milhões de toneladas foram depositadas em aterro, o que compromete  posicionamento da indústria em termos de sustentabilidade do produto.

A situação é crítica, e os estudos apontam para o esgotamento da capacidade dos 35 aterros urbanos existentes já a partir de 2027.

Apesar de avanços na separação e encaminhamento dos resíduos para reciclagem,  é inegável que ainda há resistência à mudança de hábitos no que diz respeito à forma como as pessoas gerem os resíduos domésticos.

Partindo deste cenário, partilho algumas propostas de ação, com o olhar no futuro e o objetivo de colocar o país na rota do cumprimento das metas a que está vinculado.

(...) a ANMP devia lançar o repto aos partidos e movimentos independentes que se candidatam a assumirem um pacto para a sustentabilidade ambiental (...)

Separação e recolha

1. Sensibilizar nos media, escolas e outras instituições para a necessidade de separar e gerir melhor os resíduos; implementar sistemas PAYT; criar apps que informem sobre horários de recolha e permitam o reporte de problemas, como contentores cheios ou resíduos acumulados.

2. Promover redes de recolha por material, diminuindo a recolha indiferenciada, e investir na monitorização em tempo real, otimizando rotas.

3. Assegurar que o regime de responsabilidade alargada do produtor garante a sustentabilidade financeira dos municípios e sistemas de tratamento pelos custos com a recolha e tratamento dos fluxos específico de resíduos.

4. Promover parcerias com o setor privado, tendo em conta a capacidade instalada no país,  com o objetivo de captar mais recursos, por separação mecânica ou outro tipo de valorização, para maximizar a recuperação de materiais.

5. Condicionar a exportação de materiais essenciais ao desenvolvimento industrial através de bonificações de captação e utilização no setor industrial nacional.

6. Potenciar a valorização de materiais, a adaptação da indústria para a sua utilização, aplicando bem o pouco financiamento disponível.

7. Canalizar verbas não executadas no PRR para promover a independência nacional de matérias-primas e energia.

8. Apostar na redução da produção de resíduos, combatendo, também, o desperdício alimentar.

9. Investir no ecodesign, que permite definir o perfil ambiental do produto, influenciar o seu desempenho de sustentabilidade e reciclabilidade e limitar embalagens desnecessárias.

10. Taxar embalagens de uso único produzidas só por material virgem.

11. Ter uma visão estratégica sobre o potencial não aproveitado nos resíduos; promover um setor musculado no tratamento e separação de matérias-primas não processadas para garantir, pelo potencial interno e importação, matéria-prima para o crescimento industrial.

Gestão de aterros

12. Aumentar e otimizar a capacidade de aterros de forma imediata até que recolhas e tratamentos seletivos (biorresíduos e multimaterial) ganhem escala e que novos investimentos de valorização energética estejam a funcionar.

13. Criar um modelo de partilha de infraestruturas a nível regional e/ou nacional, para maximizar a capacidade para tratamento da fração residual de RU e RNU.

14. O movimento transfronteiriço de resíduos para valorização energética foi uma possibilidade colocada no encontro sobre resíduos promovido pela ANMP. Reflete a necessidade de ações pragmáticas para os desafios de gestão de resíduos no curto prazo e encontra paralelo em países como Itália, Grécia, Malta e Reino Unido, que optaram por esta solução transitória enquanto não melhoram os números da recolha seletiva e preparam as infraestruturas de valorização energética.

Valorização Energética

15. Desmistificar a incineração, que é a resposta mais eficaz para reduzir a dependência de aterros; informar sobre a rigorosa monotorização e avaliação quanto ao seu impacto ambiental e a contribuição para a descarbonização e a transição energética. Ao transformar resíduos (fração resto) em energia, a LIPOR injeta na rede pública o equivalente a um aglomerado populacional de 130 mil pessoas. Pelo pesado investimento que representa, pode ser promovida pelo setor privado, cabendo ao Governo desenhar um pacote de incentivos  que torne o sector atrativo (tarifa bonificadas, financiamento/garantias através do Banco de Fomento e prioridade de injeção da energia produzida na rede).

Biogás e Biometano

16. Reduzir as emissões de GEE, descarbonizar a economia, substituir a importação de gás natural por gases renováveis, incluindo na mobilidade, aproveitar os recursos endógenos existentes. O setor dos resíduos encontra-se especialmente capacitado para criar uma cadeia de valor para o biometano. É necessário que o Governo avance com a definição dos instrumentos de incentivo (ex: tarifas bonificadas, leilões dedicados) para que o setor invista em tecnologias de digestão anaeróbia com produção de biometano e posteriormente em tecnologias de biometano sintético, dando cumprimento à expetativa criada pelo plano de ação para o biometano. Não definir regras e compromissos cria condições para que o investimento fique por tecnologias de compostagem, menos dispendiosas em termos de CAPEX e de OpEX, que servem o cumprimento das metas de deposição em aterro, mas acentuam a dependência energética. No REPowerEU, a UE assumiu a necessidade de aumentar a produção de biometano, duplicando a ambição para 2030 (35 mil milhões de metros cúbicos de biometano sustentável) e aponta este gás como um pilar para uma energia mais segura e sustentável.

O setor dos resíduos encontra-se especialmente capacitado para criar uma cadeia de valor para o biometano. É necessário que o Governo avance com a definição dos instrumentos de incentivo (...)

Desclassificação de resíduos

17. Está intrinsecamente relacionado com os princípios da economia circular, promovendo a reutilização e a consequente redução de resíduos em aterro.

Reduzir a deposição em aterro para 10% até 2035 é ambicioso, mas imprescindível. Será necessário implementar soluções integradas e corajosas, um avultado investimento financeiro, mas também uma transformação cultural e estrutural na forma como gerimos os nossos recursos e resíduos. O sucesso não será medido apenas pelas metas atingidas, mas pelo legado que deixaremos para as próximas gerações: um país mais eficiente, sustentável e comprometido com o futuro.

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