
Economia Circular: identifiquem-se todos os obstáculos
Nos últimos dias, o Plano de Ação Terra foi muito falado a propósito do diagnóstico da situação dos aterros. A constatação - assumida oficialmente pelo Ministério do Ambiente e da Energia - de que há um problema muito sério fez bem ao setor, tão habituado que está a empurrar com a barriga os problemas ao longo de anos. Talvez por isso, ninguém terá dado muita importância à principal resposta que o Plano Terra apresenta para resolver os vários desafios da gestão de resíduos: a promoção da economia circular, que constitui o seu primeiro eixo de ação.
Depois de fazer um diagnóstico detalhado sobre a situação dos resíduos em Portugal, o Plano de Ação Terra aponta a promoção da economia circular como um instrumento poderoso capaz de responder à situação do setor: aterros próximos do esgotamento e uma capacidade insuficiente de tratamento que, inevitavelmente, tornam o cumprimento das metas nacionais um objetivo longínquo.
O plano é enquadrado pelo lema “transformação de resíduos em recursos ambientais”. O princípio é excelente, sobretudo quando sabemos que a produção de resíduos continua a aumentar, com mais turismo e com mais emigração (é, aliás, a mais recente má notícia). Agora, é preciso passar das palavras aos atos, e essa tem sido a grande dificuldade.
Na União Europeia, estas orientações já têm barbas e ficaram escritas em documentos que hoje têm mais de 15 anos. Mas, por cá, pô-las em prática foi algo que nunca aconteceu. É por isso que Portugal fica sempre muito mal na fotografia do Eurostat em matéria de economia circular.
Não é que nunca tenha havido planos e boas intenções. Volta não volta surgem vozes inspiradas, algumas com muita autoridade até, a afirmar que a economia circular vai acontecer. Explica-se ao setor que o futuro é mesmo por aí. Mas depois, na prática, nada acontece, porque não passam de meras intenções proclamadas, sem vislumbre de caminho que deva ser seguido.
A economia circular não se decreta com discursos ou apresentações em PowerPoint. É necessário agir, trabalhar no assunto e orientar tudo e todos para o objectivo. Logo à partida, é preciso começar por identificar as dificuldades. Onde estão, afinal, os obstáculos? Se calhar, são muito diversificados. Comecemos por aí. Se quisermos mesmo promover a economia circular, nada o impedirá.
Este Governo, no Plano Terra, diz ser necessário acelerar procedimentos administrativos - e já agora, dizemos nós, alterá-los e simplificá-los. Sim, seguramente que o caminho também é por aí, mas importa não esquecer outros obstáculos, todos, que nenhum fique de fora. Desde logo, é necessário potenciar a transformação de resíduos em recursos secundários utilizáveis pela economia. Olhar para esses recursos e deixar de os classificar com o carimbo “resíduos” ou, se gostarem muito desse carimbo, trabalhar em procedimentos simples e acessíveis que, sem exigir maratonas só possíveis para ironman e ironwoman, permitam transformar a sua desclassificação num processo simples. A começar pelos aterros esgotados, as oportunidades são muitas e estão um pouco por todo o lado. E os ditos resíduos serão amanhã recursos, finalmente.
Depois disto, a economia circular poderá ter um papel diferente na gestão de resíduos em Portugal. O mercado, o parceiro pobre do setor, encarregar-se-á de pôr a economia a circular.