Gestão de biorresíduos, perspetivas e desafios
Neste artigo pretende-se 1) resumir a situação de Portugal em relação às opções de tratamento dos RU e cumprimento de metas, nomeadamente de PRR e aterro, 2) apresentar a estratégia concertada, de âmbito nacional, para a valorização dos biorresíduos e 3) salientar aspetos críticos na sua gestão.
Em 2020, a meta de PRR devia ter atingido 50% e não ultrapassou 38%: 43% são RUB de TMB, 9% RUB de recolha seletiva, 39% recolha seletiva material, 2% recicláveis de TM e 7% outros. Também os RUB depositados em aterro não deviam ter ultrapassado 788.452 toneladas e na realidade, segundo RARU 2021, foram depositadas 1.187.426 toneladas. Continuamos assim com forte dependência do aterro (41% destino direto de RU e 64% destino direto e indireto), nomeadamente para deposição de RUB, e a reciclagem é conseguida maioritariamente a partir de RUB tratados em TMB. Em 2030, os RUB tratados em TMB não poderão ser contabilizados para a meta de PRR e em 2035, os RU destinados a aterro não poderão ultrapassar 10% (diretos e refugos e rejeitados).
Nos últimos anos, foi feito um esforço para alinhamento das ações tendo em vista a obrigatoriedade da recolha seletiva de biorresíduos em 2023, e a sua contribuição para a meta de PRR de 60% em 2030. Sem ser exaustivo, refere-se a publicação, em 2019, do modelo que define o potencial técnico-económico para a recolha seletiva e reciclagem na origem de biorresíduos para as freguesias de Portugal continental.
Em 2020, foi confirmada a competência dos municípios para a recolha dos biorresíduos na sequência da revogação do Despacho 7290-B/2019. Foi também apresentada a Estratégia dos Biorresíduos - Contas Certas nos Resíduos, que pretende 1) garantir a transição para a recolha seletiva dos biorresíduos e a utilização da capacidade instalada de compostagem e digestão anaeróbia substituindo-se progressivamente as origens de recolha indiferenciada, 2) promover a utilização do composto resultante da valorização dos biorresíduos, 3) promover a recuperação do biogás proveniente da valorização dos biorresíduos. Nesta sequência de ações concertadas em prol dos biorresíduos foi aprovado o “Programa de apoio à elaboração de estudos municipais para o desenvolvimento de sistemas de recolha de biorresíduos” (Despacho 7262/2020).
As linhas orientadoras para a elaboração dos estudos municipais consideraram indispensável, a identificação e caraterização dos produtores domésticos e não domésticos, nomeadamente estabelecimentos do Canal Horeca e outros setores similares, no que se refere aos resíduos alimentares e resíduos verdes.
E incluíam a utilização de um simulador para desenvolvimento e comparação dos cenários de recolha seletiva e reciclagem na origem de biorresíduos e reporte uniforme de resultados. 90% dos municípios do continente responderam a este apoio através de candidaturas individuais, organizados nas comunidades ou nos SGRUs.
Recentemente foi feita a avaliação destes estudos municipais e elaborados pareceres por município, tendo em consideração o cumprimento da meta de PRR em 2030 e as orientações definidas no PERSU 2030 (versão de dezembro 2021). Esta abordagem permite, de forma atempada, a revisão dos estudos municipais para o seu alinhamento com os objetivos do PERSU 2030, na perspetiva da elaboração dos PAPERSU, bem como o enquadramento necessário para a candidatura a apoios financeiros.
Salientam-se, ainda, alguns aspetos críticos na gestão dos biorresíduos:
- recolher biorresíduos em quantidade e qualidade (contaminação mínima) e em coordenação com as outras recolhas, sobretudo de resíduos indiferenciados;
- identificar e caraterizar produtores (domésticos e não domésticos), e resíduos (alimentares e verdes), para gerir de acordo com as necessidades específicas, nomeadamente recolha porta a porta para produtores não domésticos (estabelecimentos do Canal Horeca e outros setores similares); atualização frequente do cadastro dos estabelecimentos é essencial;
- garantir a acessibilidade de 100% ao serviço de reciclagem na origem e/ou recolha seletiva de biorresíduos, de modo a abranger todo o potencial;
- aproximar o contentor de biorresíduos do produtor nomeadamente usar, no caso da recolha em via pública, a distância ao contentor de resíduos indiferenciados como distância máxima para a localização do contentor de biorresíduos;
- usar taxas de captura de biorresíduos fundamentadas na experiência nacional e internacional;
- reutilizar sacos comprovadamente biodegradáveis em condições de compostagem usados na aquisição de fruta e legumes para acondicionar os biorresíduos de recolha seletiva;
- envolver a população nas várias fases dos projetos de biorresíduos e divulgar os resultados;
- implementar sistemas que premeiam quem separa ou outros sistemas equivalentes.
Espera-se, assim, que o esforço de planeamento dos municípios, concertado no âmbito dos SGRU e enquadrado pelas diretrizes nacionais bem como apoiado em financiamento permita convergir para os objetivos de 2030.