OCDE: um olhar cinzento sobre a performance ambiental de Portugal

OCDE: um olhar cinzento sobre a performance ambiental de Portugal

O relatório da OCDE sobre a performance ambiental de Portugal apresentado publicamente hoje, deixa um travo amargo de insuficiência e desalento face aos resultados alcançados pelo nosso país.

Na avaliação crítica sobre diversas dimensões de política setorial, sobressai entre aspetos positivos e negativos um balanço que é claramente insuficiente face ao que podia e devia ser a ambição nacional.

Sistematizando uma análise breve, há seis pontos a salientar:

1. Há progressos na direção da sustentabilidade, mas curtos. Pela positiva importa assinalar a mitigação das emissões de gases com efeito de estufa e o aumento da produção de eletricidade renovável, que colocam as metas de 2030 ao nosso alcance. Contudo, para atingir a neutralidade carbónica em 2050, eventualmente em 2045, são necessárias medidas concretas e mais articuladas entre diversos setores. Precisamos de mais planeamento, de mais ação…e de menos promessas.

2. Necessidade de maior aposta na eficiência energética e na mobilidade sustentável. Não basta produzir mais energia renovável, continuam a faltar ações de maior escala na redução de consumos ou na renovação do edificado para combater a pobreza energética que afeta mais de 20% da população. A descarbonização dos transportes também tem de ser acelerada.

3. Portugal falhou a maioria das metas no setor dos resíduos. Os indicadores mostram que a economia circular é ainda uma miragem. A produtividade no uso dos recursos é baixa, a reciclagem é insuficiente, a produção de resíduos é elevada e a deposição em aterro é excessiva. As políticas para os resíduos falham reiteradamente e ainda não se percebeu como será “virada a página”, para usar uma expressão favorita do governo.

4. Pressões agravadas sobre os recursos hídricos. Este será um dos maiores desafios que Portugal enfrentará nas próximas décadas. A OCDE destaca o aumento do consumo pelo setor agrícola e a necessidade de apostar em eficiência hídrica, bem como de garantir a qualidade das massas de água. Os serviços de água e saneamento, onde continuam a existir problemas por resolver, são também visados. 

5. Biodiversidade enquanto “parente pobre” da política de ambiente. Durante a última década houve uma deterioração de habitats e espécies, continuando a faltar o investimento em proteção e restauro de ecossistemas. Por outro lado, os riscos têm aumentado, por exemplo, por via dos incêndios florestais. Em 2020, apenas 0,1% do PIB foi despendido na salvaguarda da biodiversidade, 25% menos do que em 2010. Supostamente 2022 foi, para o governo, o “Ano da Conservação da Natureza”…digo supostamente, porque não passou de uma intenção anunciada.

6. Uma tríade virtuosa: investimento, emprego e fiscalidade verde. Uma melhor conjugação destas três dimensões pode ajudar Portugal a “dar o salto” em direção à sustentabilidade. O relatório refere a importância de aproveitar os financiamentos disponíveis no quadro da União Europeia para qualificar os setores do ambiente, referindo também o nexo com o setor da agricultura e do desenvolvimento rural. Por outro lado, há que antecipar a necessidade de mão de obra qualificada para trabalhar nestes setores cada vez mais intensivos em conhecimento e inovação. Os empregos verdes, ou green jobs, serão uma grande oportunidade para as gerações mais novas. E há ainda a fiscalidade verde cuja reforma iniciada em 2014 deve ser retomada e aprofundada, reduzindo incentivos perversos e criando estímulos a uma maior eficiência de recursos.

Este relatório, que tem o mérito de trazer uma visão de conjunto sobre diversos setores da política de ambiente em Portugal, traduz um olhar independente, técnico e fundamentado que nos pode ajudar a melhorar.

As recomendações evidenciam também os grandes desafios que se colocam em termos de descarbonização, proteção da biodiversidade ou da circularidade da economia. Um alerta para a necessidade do governo priorizar a politica ambiental e reforçar a ambição para um futuro mais verde.

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