Porque é que as redes de águas são sistematicamente reabilitadas de forma insuficiente?

Porque é que as redes de águas são sistematicamente reabilitadas de forma insuficiente?

Ao longo dos últimos 15 anos, a ERSAR tem utilizado a reabilitação da rede como um indicador-chave de desempenho dos serviços de águas (KPI). Este é definido como a percentagem média anual de condutas de abastecimento e coletores de águas residuais, com idade superior a 10 anos, que foram reabilitadas nos últimos 5 anos:

  • Uma percentagem entre 1,5% e 4,0% ao ano é avaliada como um bom nível de desempenho;
  • Uma percentagem entre 0,8% e 1,5% e acima de 4,0% ao ano é avaliada como medíocre/ mediana;
  • Uma percentagem inferior a 0,8% ao ano é avaliada como fraca/insatisfatória.

É consensual entre os profissionais do setor da água que uma intensidade adequada de reabilitação das redes ao longo do tempo é fundamental para garantir a sustentabilidade infraestrutural da prestação adequada de serviços de águas. De facto, a evidência empírica do setor da água português apresenta uma correlação forte e inversa entre a intensidade da reabilitação da rede e os níveis de água não faturada (coeficiente de correlação de -61,7% numa amostra de 193 entidades gestoras).

a evidência empírica do setor da água português apresenta uma correlação forte e inversa entre a intensidade da reabilitação da rede e os níveis de água não faturada

Ao defender uma taxa de renovação da rede de pelo menos 1,5% ao ano, a ERSAR assume implicitamente que a vida útil média das redes não deve ultrapassar os 65 anos. No entanto, a média ponderada deste indicador em Portugal situa-se atualmente em 0,5% ao ano: uma vida útil implícita de 200 anos!

A “sabedoria convencional” do setor aponta o dedo a “um problema sistemático de recuperação insuficiente dos custos por parte da maioria dos serviços de água, o que impede a geração dos fluxos de caixa necessários para o investimento na reabilitação das redes”.

Se isto for verdade, esperaríamos naturalmente observar uma correlação forte e positiva entre o grau de recuperação total dos gastos e a intensidade da reabilitação das redes. Contudo, a evidência empírica do setor da água português (amostra de 169 entidades gestoras) mostra que este não é claramente o caso (coeficiente de correlação de 7,0%). Em termos simples, a disponibilidade de fluxos de caixa não é claramente uma condição suficiente para garantir que as entidades gestoras invistam suficientemente na reabilitação das suas redes.

Examinámos igualmente até que ponto a intensidade da reabilitação das redes está relacionada com a dimensão da entidade gestora. Novamente deparamos com a ausência de qualquer correlação estatística significativa (coeficiente de correlação de 11,3%).

Além disso, a tendência no setor da água português ao longo dos últimos 10 anos tem caminhado na direção errada, com um declínio gradual na intensidade da reabilitação das redes.

Portanto, a questão permanece: “porque é que as redes de água são sistematicamente reabilitadas de forma insuficiente?”

Infelizmente, este não é um problema confinado ao setor da água português. O regulador dinamarquês defende uma taxa de reabilitação das redes de 1,33% ao ano, ou seja, uma vida implícita dos ativos de 75 anos. Tomando a média dos últimos 10 anos para uma amostra de 80 entidades gestoras dinamarquesas, este indicador é de 0,8% ao ano. Muito melhor que em Portugal, mas ainda assim aquém da intensidade desejada.

Consequentemente, a identificação de novas abordagens para neutralizar eficazmente estas “falhas de incentivo” por parte das entidades gestoras deverá revelar-se um caminho fundamental para investigação futura.

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