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Reflexões sobre a conclusão do concurso de atribuição de 500 MW em potência de armazenamento por baterias

Reflexões sobre a conclusão do concurso de atribuição de 500 MW em potência de armazenamento por baterias

O gabinete da Sr.ª Ministra Maria da Graça Carvalho anunciou que foi concluído o concurso «Flexibilidade da Rede e Armazenamento», que irá financiar a instalação de pelo menos 500 MW de capacidade de armazenamento. Foram aprovados 43 projetos que irão receber uma contribuição financeira de cerca de 100 milhões de euros.

Foi excelente a decisão do Governo em promover o armazenamento, mas a questão que fica por responder é se o caminho escolhido terá sido o mais adequado.

Para os Promotores, parece que foi uma boa decisão pois, no curto espaço de tempo dado pelo Governo para este concurso, foram recebidas 79 candidaturas, ultrapassando largamente o montante de potência de 500 MW antevisto.

Mas para o sistema elétrico nacional será que esta decisão terá sido a melhor? E que lições se deverão retirar deste processo? É o que vamos analisar em seguida.

1. Para os consumidores, será que a energia elétrica vai ficar mais barata?

Teoricamente, sim, ficará mais barata, pois, a manterem-se todas as outras variáveis, o armazenamento vai permitir uma oferta mais competitiva nos períodos em que seria o gás a marcar o preço, reduzindo marginalmente o número de horas em que isso sucede. É um passo no sentido certo, mas, na realidade, não irá ser possível sentir resultados práticos, pois a quantidade de energia de que estamos a tratar é despicienda.

2. A expetativa dos promotores para recuperar o investimento está apenas suportada pela arbitragem de preço nos mercados diário e intradiário ou haverá outras fontes de receita?

Creio que, como regra geral e cautelar, os promotores deveriam ter considerado que o proveito provém apenas da arbitragem de preço. Contudo, se surgir a vantagem em participar no mercado de serviços de sistema em complemento ao mercado diário de energia, poderá daí advir um proveito complementar, o qual, contudo, é de quantificação muito difícil, pois o modelo de mercado está em processo de alargamento a mecanismos pan-europeus que podem resultar numa maior concorrência e, portanto, de margens mais pequenas.

(...) os promotores deveriam ter considerado que o proveito provém apenas da arbitragem de preço

3. E quais serão os procedimentos mais adequados a usar em futuros mecanismos?

Creio que o modelo usado neste concurso de promoção do armazenamento, que no processo de seleção não define qualquer critério de preço ou de qualidade do serviço prestado, não é o mais adequado.

Em primeiro lugar, porque toda a aplicação de dinheiro público deve ser feita em processos concorrenciais claros e transparentes, baseados em critérios de preço e de qualidade, entre outros. A qualidade pode medir-se, por exemplo, pelo número de horas seguidas que o ciclo carga/descarga permite, sendo que as baterias têm ciclos típicos entre as 2 e as 4 horas, enquanto, por exemplo, a bombagem hidroelétrica tem ciclos que, grande parte das vezes, se situam entre as 8 e 24 horas. E estas diferenças são determinantes para os requisitos de funcionamento do sistema elétrico.

A bombagem hidroelétrica dota o sistema elétrico de muito maior flexibilidade e segurança, o que justifica por si só uma valoração acrescida destas funcionalidades.

De igual forma, o facto de um dos atributos determinantes na hierarquização dos projetos ser o de estarem localizados em determinadas zonas de rede, deixa um amargo de boca, pois não foi definido um critério universal para a seleção desses locais. Por outro lado, os prazos foram e são demasiado apertados, sendo que o investimento deve estar concretizado até 31 de dezembro de 2025. Resta saber quando entrarão efetivamente em serviço!

4. E qual o impacte da instalação desta potência de armazenamento do ponto de vista do sistema ibérico como um todo?

Como sabemos, os sistemas elétricos de Portugal e Espanha funcionam em mercado único, ou seja, todos os intervenientes no mercado diário fazem as suas ofertas numa bolsa única, no caso, localizada em Madrid.

Em consequência, as ofertas em mercado destes 500 MW estarão a competir com algumas dezenas de milhares de MW que já estarão em operação nessa altura no sistema espanhol. Ou seja, estamos a falar de um acréscimo quase marginal de potência de armazenamento ao nível ibérico.

Foi (...) uma oportunidade perdida o facto de o concurso em apreço não ter sido tecnologicamente neutro

Esta atribuição de potência de armazenamento em Portugal parece não ter obedecido a qualquer visão integrada das necessidades para o sistema português, tendo antes sido um ato avulso, sem visibilidade de quais poderão ser as medidas futuras. Mas o mesmo já não sucederia se estivéssemos a falar de bombagem hídrica, pois, neste caso, os dois sistemas ibéricos estão quase em paridade, e seria nesta matéria que Portugal poderia continuar a marcar a diferença, acrescentando valor.

Foi, pois, uma oportunidade perdida o facto de o concurso em apreço não ter sido tecnologicamente neutro, o que se espera que seja corrigido em próximas iniciativas governamentais.

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