
Sinais no escuro
Em cima dos acontecimentos chega a ser difícil apercebermo‑nos do brutal retrocesso civilizacional a que fomos condenados desde o início desta guerra. Acima de tudo pela tragédia das mortes e a barbaridade da destruição, mas também pela forma como se impôs um súbito imobilismo perante a emergência climática.
O resultado é que, em poucos meses, recuámos no tempo a uma escala troglodítica: além de uma guerra feroz na Europa e de uma exponencial corrida ao armamento, volta‑se a queimar carvão para acender a luz e aquecer as casas quando chegar o inverno; regressam os mega‑interesses da fissão nuclear; e ficámos ainda mais escravos das petrolíferas cujos lucros dispararam e que os Estados continuam a dispensar de pagar impostos sobre esses lucros extraordinários, apesar das insistências do Secretário Geral das Nações Unidas e do próprio FMI.
E tudo isto quando estávamos prestes a assegurar novas conquistas na transição energética. Contudo, o tempo está aí a contar e as novas gerações não desapareceram nem perderam a consciência que vinham manifestando da necessidade urgente de mudar. Mudar não só o mix energético, mas mudar o poder dos grandes poderes predatórios e mudar o futuro para uma trajectória convergente entre a vida e o planeta.
São pequenos os vestígios de mudança e sobretudo muito ambivalentes, mas estão cá e merecem atenção. Nos EUA o pacote ambiental de Joe Biden recentemente aprovado tem algo de faustiano, mas antes este que nenhum. Na UE, apesar de se ter metido parte do Pacto Ecológico Europeu na gaveta, não se esqueceu nem o potencial do hidrogénio verde, nem o solar, nem a eólica off‑shore, nem a eficiência e a poupança. Apesar de toda a raiva que a actual situação levanta a todos os que vêem o futuro subitamente levado a um nível de risco de insustentabilidade tão extrema, fica também cada vez mais clara a necessidade de fazer a transição energética depressa e de forma justa e integrada. É aí que a comunicação e a informação se tornam tão importantes.
Serão elas que não nos deixarão esquecer o que importa e nos mobilizam para o futuro mesmo que o tempo pareça ter andado para trás.
A ciência, a tecnologia, a participação cidadã, a atenção da opinião pública sobre as condições em que as medidas de urgência foram agora tomadas, são, nesta altura, essenciais. Se tudo voltou para trás tão depressa, será possível também, e oxalá que em breve, pôr tudo de volta a andar para a frente outra vez. Há que estar informado, atento, agir e pressionar.