Uma ambição para Portugal: criar um Mercado Voluntário de Carbono nacional
Atualmente, apenas as empresas mais intensivas do ponto de vista energético compensam as suas emissões de carbono. Fazem-no através do Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE), que renova os seus créditos em zonas de floresta fora do espaço europeu, como por exemplo na Amazónia e noutros países que tem um mercado consolidado nesta matéria.
A floresta portuguesa é um ativo muito relevante, no qual deveríamos introduzir a monetização dos serviços de ecossistema
A floresta portuguesa é um ativo muito relevante, no qual deveríamos introduzir a monetização dos serviços de ecossistema. Da mesma forma, a agricultura portuguesa tem condições para demonstrar que a proteção da biodiversidade é compatível com a produção de alimentos, podendo também, e devendo, ser geradora de créditos para um Mercado Voluntário de Carbono (MVC) nacional.
O MVC poderia não só abranger o território nacional como também estender-se aos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa com o apoio da diplomacia portuguesa
Portugal tem a ambição de criar um MVC e de poder valorizar económica e ambientalmente os territórios mais vulneráveis no país, pela perda da população ou por outros efeitos relacionados com as alterações climáticas, o que os leva hoje a não conseguirem preservar e conservar o seu património ambiental e natural.
Portugal tem a ambição de criar um MVC e de poder valorizar económica e ambientalmente os territórios mais vulneráveis no país
Este MVC poderia não só abranger o território nacional como também estender-se aos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa com o apoio da diplomacia portuguesa.
Desta forma, e a par das ações de mitigação a adotar no âmbito do processo de transição climática elencadas no PNEC 2030 e no RNDC 2050, recorreríamos a outros instrumentos ao nosso dispor para apoiar os objetivos e metas climáticas definidos a nível nacional, europeu e internacional.
Devemos ser inovadores e criar mecanismos de valorização ambiental, mas também económica e social dos territórios de baixa densidade, acreditando que, por esta via, também será possível financiar a atração de pessoas para este território e apoiar os que nunca desistiram de viver em territórios mais isolados e afastados dos grandes centros urbanos.
Um futuro MVC deverá gerar incentivos económicos para reduzir as emissões e aumentar o sequestro de carbono, é preponderante que este mecanismo funcione numa lógica de adicionalidade, reforçando a relação custo-eficácia de medidas de mitigação de Gases de Efeito Estufa (GEE) e promovendo soluções e tecnologias inovadoras, constituindo um instrumento que permite apoiar o cumprimento dos objetivos nacionais em matéria de ação climática, acelerando a transição para uma sociedade neutra em carbono e reforçando o compromisso com os «Objetivos do Desenvolvimento Sustentável» da Agenda 2030 das Nações Unidas.
Um MVC nacional seria uma oportunidade única de valorizar atividades como a agricultura, as florestas e o setor primário que garantem dois pilares fundamentais do bem-estar humano: a garantia de boa alimentação com segurança e a preservação do ambiente.
Foram diversos os fatores, quer de natureza social quer de âmbito económico, que conduziram ao abandono de grande parte das áreas rurais do território nacional, tornando-os mais vulneráveis, em particular ao risco de incêndio e de perda da sua biodiversidade. Mas são estes territórios que contribuem de forma positiva para a captura de carbono em Portugal, pelo que devem ser compensados e remunerados por esta atividade.
Por outro lado, com a nossa vasta área de mar, quatro mil quilómetros quadrados, é igualmente importante aproveitar esta oportunidade para incentivar a implementação de ações de restauro ecológico e desenvolvimento sustentável de ecossistemas costeiros e marinhos, pradarias de ervas marinhas, recifes ou florestas de algas.
Neste contexto, importa que o conhecimento nesta área seja aprofundado no futuro, em consonância com o previsto na Lei de Bases do Clima.
O MVC deverá reger-se por princípios que não permitam abusos financeiros por parte dos agentes que nele vão operar:
- Credibilidade: os projetos devem assentar em cenários de referência realistas e robustos;
- Adicionalidade: a redução de emissões de GEE ou o sequestro de carbono previstos apenas ocorrem com a concretização do projeto proposto;
- Permanência: manutenção das emissões sequestradas, garantindo a existência de salvaguardas que permitam compensar situações de reversão;
- Eficácia: evitar potenciais fugas de carbono fora da fronteira do projeto, motivadas pela sua implementação;
- Acompanhamento: monitorização, reporte e verificação robusto para contabilização das reduções de emissões;
- Transparência: garantir o acesso público à informação;
- Sustentabilidade: existência de benefícios ambientais e socioeconómicos, em linha com os Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável.
Os compromissos de neutralidade carbónica assumidos pelas organizações devem ter subjacente um mecanismo transparente e verificável de contabilização e compensação de emissões que permitam aferir o progresso alcançado no cumprimento desses compromissos.
Neste sentido, será fundamental poder criar um ecossistema transparente, baseado num modelo digital, robusto, aproveitando mecanismos como a Bolckchain ou os Smartcontrats, que permita oferecer garantias aos investidores nacionais e internacionais da fiabilidade do MVC Português.
Um tal sistema permitiria, por exemplo, que uma empresa que esteja situada em Proença-a-Nova possa compensar as suas emissões no valor natural do Pinhal Interior. Isto significa que, em vez de criar valor num outro país, se possa fazer numa floresta nacional, recompensando desta forma projetos geradores de créditos.
Este projeto vai além do Carbon Border Ajust Mecanism (CBAM), da União Europeia, uma nova fronteira de impostos.