Urgência, concorrência e eficiência

Urgência, concorrência e eficiência

O processo de consulta pública e avaliação política da proposta técnica para o novo plano estratégico do setor da água (PENSAARP 2030) decorre há 2 anos — o dobro do tempo que demorou a sua elaboração. Como entender esta demora num contexto de urgência?

Será porque apresenta objetivos concretos e ambiciosos, com base em indicadores que permitirão uma avaliação inequívoca dos resultados?

Será porque quantifica necessidades de investimento várias vezes superiores ao valor dos fundos europeus disponíveis, implicando o aumento do financiamento e/ou capital privado?

Ou será porque evidencia a inevitabilidade de uma subida das tarifas médias entre 20% e 50%, assegurando, ainda assim, um preço aceitável do ponto de vista social?

Independentemente da motivação, facto é que o diagnóstico traçado do setor no presente é assustadoramente próximo do apresentado, há cerca de uma década, no PENSAAR 2020:

  • falta, na generalidade dos casos, de competências de gestão;
  • baixa participação do setor privado;
  • elevada e persistente ineficiência;
  • tarifas insuficientes para a sustentabilidade das entidades gestoras que, por isso, vão recorrendo aos contribuintes nacionais e europeus e vão adiando, ad aeternum, o investimento em reabilitação.

Assim, nove anos passados e 660 milhões de euros de fundos distribuídos com critérios genericamente desconhecidos (exceção feita à recente imposição indiscriminada de dois modelos de gestão: pró-agregações e contra concessões a privados) ou feitos à medida de determinado destinatário, sem qualquer responsabilização pelos resultados, estamos perante um setor envelhecido, com um baixo nível de desempenho médio e uma diferença cada vez mais acentuada entre os melhores e os piores.

Mas, se é verdade que não mudar nada implica que fique tudo na mesma, como bem demonstra esta última década, a estagnação que temos visto no setor não tem de ser uma inevitabilidade.

O que falta então a algumas entidades para fazerem a sua parte no que deve ser um desígnio nacional? Sem dúvida: motivação. Direitos de gestão (ou de estabelecimento) atribuídos por decreto, sem ir à concorrência, onde as tarifas são as necessárias para cobrir os custos, sejam eles quais forem, que não se consigam transferir para os contribuintes, não irão, nunca, incentivar eficácia, eficiência ou sustentabilidade.

Se, com as alterações climáticas, podemos dizer que o tempo não está para melhorar e, com a falta de investimento, que as infraestruturas não estão a ir para novas, a falta de motivação e desenvolvimento no setor apenas pode levar à perda de competência.

Temos todas as condições para ambicionar um setor competitivo e sustentável onde, além de se assegurarem serviços com qualidade e a eficiência tão importantes para os tempos de escassez que se avizinham, se contribua para uma economia exportadora.

As regras são simples:

  • os subsídios ao investimento, se e enquanto existirem, serão previsíveis e agnósticos a todas as opções de gestão, garantindo um ambiente de compromisso para com resultados medidos na qualidade do serviço, assim como transparência e competitividade no acesso;
  • a sustentabilidade advirá de tarifas que cubram os custos presentes e futuros. Aos impostos caberá apenas a dimensão social para quem dela efetivamente precisar;
  • a concorrência assegurará os incentivos e responsabilização necessários para que os custos, económicos e ambientais, sejam os menores possíveis, assim como a dinamização do setor privado;
  • a internacionalização de operadores privados, os únicos cujo capital faz sentido arriscar noutras geografias, permitirá transformar um setor, essencialmente, consumidor de recursos num fator de crescimento do produto nacional.

Neste contexto, diria que a palavra-chave para que, nesta década, voltemos a testemunhar um salto qualitativo como o que vimos no início do século é, precisamente, concorrência.

E, felizmente, não é preciso ir muito longe para encontrar exemplos de introdução de concorrência em monopólios.

Se é verdade que na concorrência pelo mercado não temos, no setor energético nacional, o melhor exemplo (o atraso nos concursos para renovação das concessões municipais das redes elétricas é inexplicável), há, ainda assim, vários modelos experimentados de introdução de concorrência no mercado energético (desde a produção à comercialização) que poderão ser adotados.

O desígnio de aumentar a concorrência, pelo mercado e no mercado, implicará, inevitavelmente, a coragem de fazer diferente para fazer melhor, recentrando o papel de todos — municípios, regulador, entidades gestoras, Águas de Portugal e estado central —, assegurando-se uma arquitetura e um quadro institucionais onde cada um se limita e cumpre com o seu papel e, economicamente, se premeia o mérito.

A estagnação não é mais opção.

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