
Governo apresenta plano de 400 milhões para reforçar segurança do sistema elétrico nacional
O Governo apresentou esta segunda-feira, 28 de julho de 2025 – dia em que faz três meses que aconteceu o apagão ibérico – o Plano de Reforço da Segurança do Sistema Elétrico Nacional, num investimento estimado de 400 milhões de euros, com impacto “residual” na fatura dos consumidores. A iniciativa foi anunciada pela Ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, e pelo Secretário de Estado Adjunto e da Energia, Jean Barroca, numa sessão realizada no Ministério do Ambiente e Energia, em Lisboa.
Maria da Graça Carvalho sublinhou que “os nossos sistemas são globalmente seguros, resilientes e confiáveis”, reforçando que o apagão teve origem fora de Portugal. Ainda assim, considerou fundamental tirar lições do sucedido. “Não podemos garantir que não volte a acontecer, mas podemos garantir que estaremos mais bem preparados”, concluiu.
“Estamos a fazer um seguro, como fazemos para a nossa habitação ou empresa”, afirmou a Ministra, garantindo que o impacto na fatura da eletricidade será “de apenas um cêntimo por cada 25 euros”, ou seja, 0,04%. O plano, que surge na sequência do apagão ibérico de 28 de abril, integra 31 medidas divididas em cinco áreas: resiliência e segurança operacional, planeamento da rede, aceleração das energias renováveis, capacidade de resposta das infraestruturas críticas e colaboração internacional.
Reforço da resiliência e da segurança
Entre as primeiras medidas anunciadas está a duplicação das centrais com capacidade de arranque autónomo, conhecidas como Black Start. A partir de 1 de janeiro, passam de duas para quatro: Tapada do Outeiro, Castelo de Bode, Baixo Sabor e Alqueva. Esta expansão exigiu alterações legislativas, nomeadamente ao Decreto-Lei n.º 55 de 2022, que já tiveram lugar,
Foi ainda aprovado o investimento de 127 milhões de euros para reforçar a segurança da rede, com medidas como a instalação de duas reatâncias shunt (equipamento instalado nas redes elétricas para ajudar a controlar a tensão e evitar sobretensões) e de dois TACOMs (sistemas automáticos de controlo de tensão) e um compensador síncrono com massas girantes, que reforçará a inércia do sistema.
Outra iniciativa é o lançamento de um mercado de serviços de sistema com base em armazenamento por baterias, prevendo-se um primeiro leilão de pelo menos 750 MVA até janeiro de 2026. O Secretário de Estado considerou esta “uma verdadeira mudança de paradigma”, por permitir soluções mais eficientes e menos dependentes do gás natural.
O Governo decidiu também prolongar o funcionamento da central da Tapada do Outeiro até 2030. Esta medida inclui um acordo transitório com a atual operadora, a TurboGás, até março de 2026, seguido de um concurso público. A central, resultante de um antigo contrato de aquisição de energia, manterá a sua função de arranque autónomo.
A Estratégia Nacional para o Armazenamento de Energia será lançada em janeiro de 2026 e incluirá soluções químicas (baterias) e hídrica (bombagem). A gestão da rede passará a ter maior transparência, com publicação de indicadores como inércia e ROCOF (variações de frequência), e será criada uma plataforma pública de dados abertos.
O reforço da cibersegurança também faz parte do plano, com a transposição da diretiva europeia NIS 2, aprovada em Conselho de Ministros e em fase de discussão parlamentar. Está ainda prevista a revisão da coordenação em situações de emergência, com melhorias nos planos de deslastres e relés mínimos de frequência, nomeadamente na rede de distribuição.
Planeamento da rede elétrica
Face ao crescente interesse de investidores em energia verde e hidrogénio, o Governo vai reformular o modelo de ligação à rede e criar novas zonas de grande procura, com destaque para uma segunda zona em Sines. O objetivo é “distribuir melhor a capacidade” e dar “respostas céleres e claras” a projetos industriais e energéticos.
Serão também realizados leilões periódicos de capacidade de injeção na rede. O primeiro leilão, a cargo da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), está previsto para setembro.
O modelo de planeamento da rede será revisto. Atualmente feito com uma previsão a 10 anos, passará a ser mais dinâmico, e os serviços públicos envolvidos terão as suas competências reforçadas. O Governo defende que este novo modelo deve ser “mais adequado à realidade” e mais eficiente.
Haverá também reportes trimestrais à DGEG sobre o progresso dos projetos de investimento, que serão divulgados ao público sempre que possível. Está ainda prevista uma análise operacional da segurança do abastecimento e a adequação dos relatórios nacionais às metodologias europeias, medida fundamental para validar apoios estatais a mecanismos de capacidade.
Aceleração das energias renováveis
O plano reforça o compromisso com a transição energética, começando com a agilização dos projetos já licenciados. Existem mais de 10.000 MW de potência atribuída com títulos de reserva, que serão alvo de medidas para facilitar a sua implementação.
Será criado um “mapa verde” com zonas de aceleração para energias renováveis, identificadas através de uma avaliação ambiental estratégica coordenada pela Estrutura de Missão para o Licenciamento de Projetos de Energias Renováveis (EMER) e pelo Instituto Superior Técnico. O objetivo é localizar áreas com menor impacto ambiental, simplificando o licenciamento e atraindo investimento. O projeto de avaliação ambiental estratégica para as zonas de aceleração das renováveis (“mapa verde”) integra-se no âmbito do PRR.
Para projetos co-localizados com produção renovável, a instalação de baterias estará isenta de avaliação de impacto ambiental. Para projetos autónomos, a isenção aplica-se a instalações até 200 MWh (com potência de 50 MW) ou até 100 MWh em zonas sensíveis, desde que cumpram critérios técnicos, como faixas de distanciamento.
O Governo está a concluir a transposição da diretiva europeia RED III. Será ainda simplificado o licenciamento de projetos de autoconsumo e comunidades de energia renovável, com alterações aos procedimentos da DGEG e articulação com autarquias.
Haverá também uma revisão do sistema de compensações aos municípios e a obrigatoriedade de os promotores envolverem as comunidades locais. Segundo Jean Barroca, esta medida pretende garantir que “os benefícios da produção renovável são distribuídos de forma mais justa”.
Infraestruturas críticas mais preparadas
No domínio da segurança de infraestruturas críticas, será lançado um concurso de 25 milhões de euros, com apoio de fundos europeus, para projetos-piloto com micro-redes, baterias, energias renováveis e autoconsumo. Estão incluídas entidades como hospitais, sistemas de água e saneamento básico.
Os manuais de procedimentos para resposta a falhas já foram elaborados para as áreas da energia, água, resíduos e ambiente. Está em curso a revisão dos exercícios de simulação e dos critérios da Rede de Emergência de Postos de Abastecimento (REPA).
Reforço da cooperação internacional
O plano inclui também uma componente de colaboração internacional. Portugal e Espanha mantêm reuniões técnicas regulares desde o apagão, agora menos frequentes, e estão a trabalhar para acelerar as interligações com França. Está prevista uma reunião com a Comissão Europeia após o verão, para definir um calendário mais rápido. Além disso, Portugal participa nos programas europeus de interconexão e flexibilidade das redes, como o Connected Europe Facility e o Repower EU, e acompanhará a evolução do European Green Package.
Paralelamente, o Governo anunciou a intenção de avaliar a viabilidade de uma ligação elétrica com Marrocos. A Ministra do Ambiente e Energia confirmou que já houve contactos entre os ministros dos Negócios Estrangeiros dos dois países. “Iremos avaliar a possibilidade de uma ligação a Marrocos, tem havido contactos, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Marrocos com o nosso ministro dos Negócios Estrangeiros”, afirmou Maria da Graça Carvalho.
Segundo a Ministra, há interesse por parte de Marrocos em reforçar as ligações à Europa, país que já possui uma interligação com Espanha e estuda uma outra com a Alemanha. “Podemos ver a possibilidade de nos ligarmos a um dos projetos existentes. Um novo de raiz será muito dispendioso, com certeza, mas iremos avaliar a viabilidade de também entrarmos num desses projetos”, explicou. Por agora, foi dado apenas um passo “muito preliminar”, seguindo-se a realização de uma primeira reunião técnica entre representantes dos dois países, a ter lugar no Ministério do Ambiente e Energia.